quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Nat King Cole, um presente para o Brasil: 1959

   1959: Com a deposição de Fulgêncio Batista (1901– 973), estabelece –se em Cuba uma sanguinária Revolução Comunista comandada por Fidel Castro. Até os dias de hoje, a minúscula ilha caribenha permanece em profundas trevas, com o seu pobre povo subjugado, suas terras arrasadas e orladas por um mar tinto de sangue. Dalai Lama empreende fuga do Tibete rumo ao exílio, em decorrência de assédio do governo chinês. É a brutalidade comunista, com seus tentáculos, espalhando – se pelo mundo e toldando o sol da liberdade. O Rio de Janeiro em 1959 pranteia a partida para o desconhecido da cantora/ compositora Dolores Duran e do compositor Heitor Villa – Lobos. Em compensação, abriram – se em flor para os amantes da música, as seguintes composições: Desafinado (Tom Jobim / Newton Mendonça), Eu sei que vou te amar (Tom Jobim/ Vinicius de Moraes), Lobo bobo (Carlos Lira / Ronaldo Bôscoli) e, Recado (Luís Antônio/ Djalma Ferreira). Era a Bossa–Nova alçando seus primeiros voos rumo ao sucesso.
 Recado
Você errou quando olhou pra mim/ uma esperança fez nascer em mim / depois levou pra tão longe de nós / seu olhar no meu, a sua voz / você deixou , sem querer deixar / uma saudade enorme em seu lugar / depois nós dois cada qual a mercê do seu destino/ você sem mim , eu sem você / saudade , meu moleque de recado / não diga que eu me encontro neste estado.
   O cantor americano Nat King Cole aportou por aqui em 1959 para duas breves apresentações uma em São Paulo e outra no Rio de Janeiro. Era a nova política do Tio Sam de aproximação com os países de língua espanhola, em plena vigência da Guerra Fria (Rússia/Estados Unidos). O astro já passara pelo México onde gravou sucessos como Quizas, quizas; Tres palavras; Yo vendo unos ojos negros, e na Venezuela onde deslumbrou-se com a música “Ansiedad”, abaixo, em tradução livre:
Ansiedade / de ter-te em meus braços / murmurando palavras de amor / ansiedade / de ter os teus encantos / e tua boca voltar a beijar / quem sabe estão chorando / meus pensamentos / as lágrimas são pérolas / que caem no mar / o eco adormecido/ desse meu lamento/ te faz estar presente / no meu sonhar / quem sabe estás chorando / ao recordar –me / e aperte o meu retrato com frenesi / e chega ao teu ouvido / a melodia selvagem / que é toda tristeza de estar sem ti.

“Quizás, quizás,quizás“, em tradução livre:
Sempre que ti pergunto/ que , quando , como e onde / tu sempre me responde / talvez , talvez , talvez / e assim passam os dias / e eu desesperando / e tu me contestando/ talvez , talvez , talvez / estás perdendo o tempo / pensando , pensando / pelo que mais tu queiras / até quando? Até quando?

   No Brasil, o cantor manteve contato com o melhor da música de então e gravou belas melodias com destaque para Não tenho lágrimas (Milton de Oliveira) e Suas mãos (Antônio Maria), fazendo dueto com Silvia Telles.
Não tenho lágrimas: Quero chorar , não tenho lágrimas / que me rolem na face / para me socorrer / se eu chorasse , talvez desabafasse / o que sinto no peito e não posso dizer / só porque não tenho lágrimas / eu vivo triste a sofrer / confesso que o riso não tem nenhum valor / e a lágrima sentida é um retrato de uma dor / o destino assim quis / de mim se separar /eu quero chorar/ não posso / e vivo a implorar.

Suas Mãos : As suas mãos , onde estão ? / onde está o seu carinho? /onde está você / se eu pudesse buscar / se eu soubesse aonde está / seu amor / você / um dia há de chegar / quando eu não sei / você vai procurar / onde eu estiver / sem amor / sem você.
 
   Neste lamento, Antônio Maria expõe sua eterna solidão de um menino – grande fadado a morrer de amor. E, morreu!  Fortaleza, uma adolescente brejeira, à época, curtia em radiolas nos bares espalhados pelos bairros, ou nas pensões alegres, os sucessos do cantor americano. O necessário acompanhamento etílico fazia – se com Rum Merino, Conhaque de Alcatrão São João da Barra, ou com uma “branquinha “empalhada, lá de Guaramiranga. Outros artefatos mais delicados para a orgia, de uso não convencional, exigiam buscas em locais insalubres como no morro do ouro (Arraial Moura Brasil, o afamado Curral), bem ali tirando fino na Santa Casa de Misericórdia.
     Relatos burlescos da época dão conta de que em certa noite, um conhecido esculápio desta praça, meio desligado das coisas terrenas, fora prestar um atendimento de emergência no famigerado Curral. Um morador em transe, que vendo cobras e lagartos nas paredes, destruía tudo a sua volta, num modesto barraco. Subindo o morro e passando em uma estreita ruela do lugar, sofreu o esculápio, um violento esbarrão de um crioulo de porte avantajado. Ao levantar – se meio aturdido, o doutor, tangendo a sujeira do até então imaculado jaleco branco, deu pelo sumiço de seu caro “Rolex¨. De imediato, empunhando um 38 de cabo perolado, fez parar o homem da favela, que já escorregava maneiro no breu da noite. “O relógio”, exigiu o médico. O “malandro “foi de cara entregando a preciosa mercadoria. Ao chegar em casa o dito doutor desabafa: “Minha velha, tive meu relógio roubado, mas logo recuperei com a ajuda de Deus e de meu “simito-esso” (Smith–Wesson). “Não, você deixou seu relógio em casa sobre a minha penteadeira, meu amor“. É, senhores, está escrito na história que um dia é da caça, o outro do caçador.
   Mas, como ia dizendo, Nat King Cole (1919–1965) nasceu em 17 de março de 1919 em Alabama nos Estados Unidos. O pai, Eduard Cole, açougueiro e diácono da Igreja Batista e a mãe, Perlina Adams, tocava órgão, acompanhando o esposo. Desde cedo aquele gigante de ébano teve intimidade tanto com o jazz como com a música gospel e a clássica. Foi recordista em vendagem de discos e era o cantor predileto de John F. Kennedy. Comandou programas de rádio e televisão que tiveram curta existência por falta de patrocinadores com coragem de bancar um cantor negro. Lutou a vida inteira contra a segregação racial. Em 1956 foi atacado durante um show em Birmingham por três elementos pertencentes a um grupo denominado “Cidadãos brancos de Alabama “. Desde então o cantor evitou apresentações em estados sulistas americanos.
   Em 1958 sua residência em um condomínio de brancos situada em Los Angeles foi atacada por membros da temível organização racista Ku Klus Klan. O conselho do dito condomínio avisou-o que não queriam indesejáveis como vizinhos. Nat concordou e de imediato redarguiu: “Eu também não, e, se eu vir alguém indesejável vindo para cá, serei o primeiro a reclamar “. Nat king Cole faleceu em 15 de fevereiro de 1965, aos 45 anos, na Califórnia, em decorrência de um Câncer de Pulmão. Três maços de cigarro por dia, ao longo do tempo minaram a voz de veludo daquele gigante afro- americano. E não me cobrem a razão, porque o destino não permitiu que cruzassem numa esquina qualquer da vida, a figura de Nat King Cole com os Quixotes, Prof. José Rosemberg, Prof. Mario Rigatto, Dra. Márcia Alcântara, Dr. Josias Cavalcante e Dr. Juvêncio Câmara Junior? Coisas da vida, sei lá! .

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