quarta-feira, 24 de abril de 2019



Meus Amigos : Os Livros
" Tenho amigos cuja companhia me é extremamente agradável: são de todas as idades e vêm de todos os países. Eles se distinguiram tanto nos escritórios quanto nos campos , e obtiveram altas honrarias por seu conhecimento nas ciências. É fácil ter acesso a eles : estão sempre à disposição, e eu os admito em minha companhia , e os despeço, quando bem entendo. Nunca dão problemas , e respondem prontamente a cada pergunta que faço. Alguns me contam histórias de eras passadas, enquanto outros me revelam os segredos da Natureza. Alguns , pela sua vivacidade, levam embora minhas preocupações e estimulam meu espírito, enquanto outros fortificam minha mente e me ensinam a importante lição de refrear meus desejos e de depender só de mim. Eles abrem , em resumo , as várias avenidas de todas as artes e ciências, e eu confio em suas informações inteiramente, em todas as emergências . Em troca de todos esses serviços, apenas pedem que eu os acomode em algum canto de minha humilde morada , onde possam repousar em paz - pois esses amigos deleitam - se mais com a tranquilidade da solidão do que com os tumultos da sociedade."
Crônica de Francesco Petrarca ( 1304 - 1374 ) : Poeta e humanista italiano , figura - chave da Renascença , para lembrar o Dia do Livro!
A foto que ilustra a crônica representa um dos cinco pequenos cômodos onde convivo , fraternalmente , com meus queridos mestres de papel .

terça-feira, 16 de abril de 2019

Fortaleza - 293 anos

Em 13 de abril de 2019 , Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, chega bela, coquete e amada em meio a mimos e festas.
"Lá, sob um claro céu de azul - turquesa, 
Onde o sol seu tesouro em luz descerra,
Lá fulge a legendária Fortaleza
Como um raro brilhante sobre a terra ...
Como um sacro penhor da Natureza,
Como um beijo auroreal que vida encerra,
Longínqua e bela, a lânguida princesa
Arfando o peito, geme e os olhos cerra...
Porque nos batem temporais medonhos,
E tivemos , no mundo, a mesma sorte,
Ó casta Fortaleza dos meus sonhos,
Meu derradeiro e desvelado anseio
É ter a paz na comunhão da Morte
Dormindo em sete palmos do teu seio "
Soneto Fortaleza, da lavra de Raimundo Varão, uma enigmática figura que peregrinou por estas paragens entre os anos de 1911 e 1915. Raimundo trabalhava na empresa fotográfica de N. Olsen e no Jornal do Ceará. Acredita - se que o mesmo não tenha nascido por essas plagas , e sim , no vizinho estado do Piauí, ou mesmo em São Paulo.
Otacílio de Azevedo ( 1892 - 1978 ) em seu livro Fortaleza Descalça , Edições UFC, 1980, assim descreve a figura de Raimundo Varão:
"Varão era alto , magro , perfil grego , sobrancelhas espessas e juntas , olhos fundos com olheiras cor de azinhavre. O rosto, muito branco , era um mapa - mundi de veias azuladas. Não dava muito valor à higiene e , quando vestia uma camisa, esta acabava - se - lhe em tiras sobre o corpo. Debaixo dessa imundície, porém, batia um verdadeiro coração de poeta. Lia muito , na maioria das vezes literatura estrangeira . Lavava cuidadosamente as mãos para poder pegar nos seus livros - que eram, num gritante contraste, imaculadamente limpos , sem um risco , sem uma nódoa... Varão possuia uma particularidade interessante : tinha seis dedos em cada mão, o que lhe aumentava o misterioso aspecto e talvez justificasse o seu comportamento esdrúxulo "
Minha querida " Loura Desposada do Sol " que teus atuais gestores , cuidem de ti , te amem com desvelo, como os teus poetas e menestreis fizeram e fazem , com mimos , nesses duzentos e noventa e três anos de História.
Amém !
      
Num trabalho pesado , nesta manhã de chuva torrencial , que ninguém é de ferro , com minha ajudante Ana Lis. Quando a sirene tocou - o arrastar de móveis de São Pedro lá nas alturas - saímos rápido para um lugar seguro.
A vida é uma aventura ousada , ou nada !
"Dizem que sou louco /por pensar assim /se sou muito louco/ por eu ser feliz/ mas louco é quem me diz !/ e não é feliz !/ não é feliz ../ se eles são bonitos/ eu sou Sharon Stone / se eles são famosos / i'm Roljing Stone/ mas louco é quem me diz! / e não é feliz!/ não é feliz.../eu juro que é melhor/ não ser um normal/ se eu posso pensar / que Deus , sou eu.../ se eles têm três carros / eu posso voar/ se eles rezam muito/ eu sou santo !/ eu já estou no céu/ mas louco é quem me diz!/ e não é feliz! / eu sou feliz ... "
Balada do Louco , composição da autoria de Arnaldo Baptista e Rita Lee.



Anões Liliputianos de J. Swift

Um alerta que serve para todos ! Uns anões liliputianos , negros nos semblantes e nas cores das vestes , tal qual o breu da noite , vagueiam abraçados e ébrios de uma doentia vaidade , num perdido burgo onde o cão perdeu as botas. 
Esses anões foram descritos na magistral obra de Jonathan Swift ( 1667 - 1745 ) " As Viagens de Gulliver " . Neste livro de aventuras , Lemuel Gulliver, um cirurgião londrino consegue escapar de um naufrágio nadando até uma exótica ilha chamada de Liliput, habitada por pigmeus. Ali o tal doutor vive dramas cruéis.
Voltando ao que interessa , no tal burgo onde o cão perdeu as botas , há que se recomendar cuidado para os cidadãos pacatos do dito burgo não pisotearem , inadvertidamente , os tais anões liliputianos. Estes julgam - se deuses, portanto , imortais e seguem normas ou leis , por eles mesmos elaboradas , que se prestam , apenas , para alimentar suas gigantescas fogueiras de vaidades. Uma luta , enfim , dantesca, desigual , mas que vale a pena enfrentar , aqueles que almejam a liberdade , a decência e a democracia.
Vaidade das vaidades, tudo é vaidade. Lembra - te homem , de que és pó e ao pó voltarás. Gênesis- A.T. ,3:19.

sexta-feira, 12 de abril de 2019

Cronos x Kairós

Um jovem pastor de almas recebeu em seu ambulatório , um casal grávido, que trazia em mão uma ecografia mostrando um feto portador de grave anomalia : uma anencefalia ( a ausência do cérebro) . O esculápio , com cautela , explicou o que significava tal diagnóstico e que caminhos poderiam ser percorridos. 
O casal com firmeza pétrea optou pelo seguimento da gestação . E assim foi feito. O epílogo da gravidez deu - se com um parto normal de um feto portador de anencefalia , vivo e que foi encaminhado para os devidos cuidados neonatais.
Passaram - se os dias , cerca de dez , e a criança seguia seu fadário. Os pais da criança conseguiram uma incubadora por empréstimo e levaram o recém-nascido para seu novo lar.
Ao final de dois meses , a pequena criatura encerrou seu périplo terreal , envolta num abraço fraterno e amoroso junto a seus familiares.
Somos todos filhos do tempo, que podemos usufruir como Cronos , que se baliza pela " batida do relógio " ; ou como Kairós , onde o tempo é medido pela " batida do coração " .
A família desta especial criança , relatou aos médicos que acompanharam - na sua peregrinação terrena , que o tempo - Kairós- usufruído com ela foi longo , rico , pleno de amorosidade e de glória.
" O ser oscila ao toque da luz .Ao meio - dia o céu é um lago - espelho de ágata azul . Nada se move. O tempo não existe. Tudo é eterno. Ao crepúsculo, entretanto , o lago imóvel se transforma num rio. Rapidamente as cores se sucedem , o azul vira amarelo , o amarelo passa ao verde , ao rosa , ao laranja, ao vermelho , ao roxo , para , finalmente , mergulhar em cachoeira no negro da noite.
Tempus fugit." ( Rubem Alves - 1933 - 2014 ).

terça-feira, 9 de abril de 2019


Nesta manhã ensolarada de sábado na Praia do Japão, em Aquiraz, esperando a chegada de velhos lobos do mar em uma jangada de vela trazendo sonhos e víveres do mundo de Netuno.
"Minha jangada de vela,
Que ventos queres levar ?
Tu queres vento de terra, 
Ou queres vento do mar ?
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar ?
Aqui no meio das ondas,
Das verdes ondas do mar,
És como que pensativa ,
Duvidosa a bocejar !
Minha jangada de vela ,
Que vento queres levar?
Saudades tens lá das praias,
Queres n'areia encalhar ?
Ou no meio do oceano
Apraz - te as ondas sulcar ?
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar?
Sobre as vagas , como a garça,
Gosto de ver - te adejar,
Ou qual donzela no prado
Resvalando a meditar :
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar?
Se a fresca brisa da tarde
A vela vem te oscular,
Estremeces como a noiva
Se vem - lhe o noivo beijar :
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar?
Quer sossegada na praia,
Quer nos abismos do mar,
Tu és, ó minha jangada,
A virgem do meu sonhar :
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar?
Se à liberdade suspiro,
Vens liberdade me dar ;
Se fome tenho - ligeira
Me trazes para pescar !
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar?
A tua vela branquinha
Acabo de borrifar;
Já peixe tenho de sobra,
Vamos à terra aproar:
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar?
AI, vamos, que as verdes ondas,
Fagueiras a te embalar ,
São falsas nestas alturas
Quais lá na beira do mar:
Minha jangada de vela,
Que vento queres levar?
Composição A Jangada , da autoria de Juvenal Galeno da Costa e Silva ( 1836 - 1931 ) . Seu livro Prelúdios Poéticos de 1856 é considerado um marco na literatura cearense.

sexta-feira, 5 de abril de 2019

Fernando Weyne/Loucuras


Fernando da Costa Weyne ( 1869 - 1906 ) , nasceu na localidade de San Fernando, no Paraguai. Filho do tenente coronel Alfredo da Costa Weyne que servia , na ocasião, ao Exército do Brasil na Guerra do Paraguai ( 1864 - 1870 ) onde a Tripice Aliança ( Brasil , Argentina e Uruguai) média forças contra o destemido presidente do Paraguai , Francisco Solano López ( 1827 - 1870 ).
Aos dois anos de idade o petiz Fernando Weyne fixou residência em Porangaba, no Ceará onde fez seus estudos básicos e partiu para a labuta como jornalista , comediógrafo, poeta e boêmio. Foi sócio fundador do Centro Literário, um dos muitos grêmios que pontificaram na inquieta juventude intelectual do Ceará no final do século XIX.
Fernando Weyne publicou em 1895 um livro de contos - " Miudinhos " . Um poema - Loucuras - dedicado a uma ex - namorada , foi musicado pelo violonista Roberto Xavier de Castro ( 1890 - 1952 ) tornado - se um duradouro sucesso a animar as tradicionais serestas , com o nome de A Pequenina Cruz do Teu Rosário. Quem primeiro gravou tal música foi o cantor paulista Roque Ricciardi ( Paraguassu) que se proclamou autor da dita composição. Isso gerou uma longa peleja judiciária e no final a família de Fernando Weyne venceu em seu pleito. Os versos foram contudo deturpados e outros cantores que gravaram tal música, como Carlos Galhardo e Carlos José, mantiveram os erros da original gravação de Paraguassu.
O poema " Loucuras" consta de 36 versos e a composição "A Pequenina Cruz do Teu Rosário " reduziu para apenas 16 versos , ainda assim , diferentes dos originais.
" Agora que não vejo - te a meu lado
A segredar - me apaixonadas juras,
Busco , às vezes, do nosso amor passado,
Recordar estas íntimas loucuras.
Faz muito tempo ...eu nem me lembro quanto !
- A vida é longa e o pensamento é vário! -
Tu mostrava - me a rir - que idílio santo !-
A pequenina cruz do teu rosario.
E sempre que me vias , recordava
Do nosso amor a fantasia louca :
Cada vez que pequena cruz beijavas ,
Eu beijava , febril a tua boca...
Mas o tempo passou. Triste, segui
Da minha vida o longo itinerário ,
E nunca mais, e nunca mais eu vi
A pequenina cruz do teu rosario.
Do amor fugiu - me a benfazeja luz !
Não posso mais ! Errante caminheiro,
Sem Cirineu, tal como o de Jesus ,
Verga meu corpo ao peso do madeiro.
Já vou trilhando a estrada da amargura !
- Antes , porém, que chegue ao meu Calvário,
Dá - me a beijar , ó santa criatura ,
A pequenina cruz do teu rosario.
Recorda ainda o nosso amor de outrora !
Vamos lembrar os tempos de criança!
- Se da vida perdi a doce aurora,
Resta em minha alma um raio de esperança:
Tu - que és tão boa , que és tão meiga e pura,
Quando eu baixar ao campo funerário,
Virás deitar na minha sepultura
A pequenina cruz do teu rosario. "
Crônica desenhada com o auxílio de um Weyne, o boêmio Francisco Clayrton.

segunda-feira, 1 de abril de 2019

A Bandeira


"Não é preciso que eu vos diga o que é este símbolo e o que significam estas continências e estas festas que o glorificam. O entusiasmo que vejo em vossos olhares, o garbo e a disciplina que diviso em vossa atitude , a vossa alegria, o vosso orgulho , a atenção e a simpatia com que me ouvis dizem - me bem que sabeis o que é esta bandeira.
Sabeis que este pano é tecido da nossa carne e do nosso espírito, das nossas bênçãos e das nossas lágrimas, do nosso passado de quatrocentos anos de sacrifícios, de trabalhos suados , de heroísmos acumulados , de batalhas sangrentas, de abnegações incomparáveis.
O que fez esta Nação e o que se representa neste lábaro é a coesão de brasileiros , é a união de aspirações das vontades de todas as gerações que nos antecederam . A bandeira é a união, o ponto para o qual convergem os olhares e os pensamentos na paz e na guerra, os soldados que morrem para salvar a comunhão ; voltam - se para ela , na paz , o lavrador que sulca o solo e o navegante que sulca o oceano , o sábio que subjuga a natureza e o artista que embeleza a vida , o professor que gera o civismo e o operário que mantém a riqueza; para ela voltam - se todos os que querem e amam e sofrem para engrandecer a Pátria.
Sede unidos, desde já, nos bancos colegiais e sede unidos depois , quando governardes o país.
Oremos ! Levantemos as nossas almas para a Bandeira. Abençoado seja o Brasil, terra formosa em que tivemos a ventura e o orgulho de nascer, abençoado seja o Brasil , terra querida na qual e pela qual queremos morrer "
Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac ( 1865 - 1918 ), nasceu e morreu no Rio de Janeiro. Dedicou - se ao jornalismo e à literatura ; ocupou vários cargos públicos. Sua obra poética enquadra - se no movimento parnasiano.