quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

 José Albano e Sua Poesia Redentora

" Poeta fui e do áspero destino / senti bem cedo a mão pesada e dura / conheci mais tristeza que ventura / e sempre andei errante e peregrino / vivi sujeito ao doce desatino / que tanto engana mas que pouco dura / e inda choro o rigor da sorte escura / se nas dores passadas imagino / porém, como me agora vejo isento / dos sonhos que sonhara noite e dia / e só com saudades me atormento/ entendo que não tive outra alegria / nem nunca outro qualquer contentamento / senão ter cantado o que sofria "
José de Abreu Albano ( 1882 - 1923 ) , nasceu no dia 12 de abril de 1882 , na cidade de Fortaleza , Ceará . Seus pais foram o negociante José Albano Filho e D. Maria de Abreu Albano ; neto pelo lado paterno de José Francisco da Silva Albano e de D. Maria Liberalina da Silva Albano , Barões de Aratanha .
José Albano foi poeta , professor , diplomata , poliglota e vernaculista , intransigente defensor da pureza do idioma de Camões . Frequentou o Seminário Episcopal de Fortaleza nos anos de 1892 e 1893 e , por não demonstrar pendores eclesiásticos, foi mandado para prosseguir seus estudos na Europa , mais precisamente na Inglaterra , Áustria e França, entre 1893 e 1898 . De volta à capital cearense estudou no tradicional Colégio Liceu do Ceará onde posteriormente tornou - se professor de Latim .
Transferiu - se para o Rio de Janeiro onde integrou o Ministério das Relações Exteriores, até ser transferido para Londres , servindo ao consulado brasileiro ( 1908 - 1912 ) .
José Albano casou - se com D. Gabriela da Rocha e constituiu uma prole de cinco filhos : Maria José , Teófilo, José Maria, Ângelo e Maria Justina .
No ano de 1912 , o irrequieto poeta largou o emprego público e iniciou uma peregrinação pelas seguintes paragens : Portugal, Espanha, França , Bélgica , Holanda , Alemanha , Hungria, Suíça , Itália , Romênia e Egito .
Regressou ao Brasil , por motivos de doença , no ano de 1014 e , após rigoroso tratamento , partiu novamente para Paris , falecendo cinco anos depois , no dia 11 de julho de 1923 , aos 41 anos de idade .
O escritor Mário de Alencar ( 1872 - 1925 ) , filho do maior nome do romance do Ceará, José de Alencar ( 1829 - 1887 ) , assim descreve o grande vate José Albano :
" Barbas densas e grandes de rabi , cenho repuxado pelo monóculo retangular , olhos incisivos que olhavam um pouco do alto e de esguelha , davam - lhe do rosto viril e bem afeiçoado , uma expressão antipática ; o molde da roupa , o chapéu luso e desabado, o andar , as maneiras , completavam a estranheza da figura , que a muitos parecia excêntrica. Conversando, sentia - se - lhe o orgulho, gerado por desdém e descontamento dos homens e das cousas do meio e do tempo . Criticava a todos e a tudo, mas sem inveja , sem vaidade , apenas porque todos e tudo não lhe respondiam ao gosto e ao ideal . A sua sensibilidade chocava - se com a natureza brasileira ; e aborrecia o presente por falta de perspectiva " .
" Há no meu peito uma porta
A bater continuamente ;
Dentro a esperança jaz morta
E o coração jaz doente .
Em toda parte onde ando ,
Ouço este ruído infindo:
São as tristezas entrando
E as alegrias saindo ."
Poema " Esparsa I " que integra o livro Rimas de José Albano , com Poesia reunida e prefácio por Manuel Bandeira ( 1886 - 1968 ).
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terça-feira, 24 de janeiro de 2023

 O Cearense Mário Gomes : Um Adeus

Mário Gomes ( 1947 - 2014 ) , filho de pai motorista , e mãe costureira , nasceu num bairro da periferia de Fortaleza . Há relatos de que cedo na vida passou por vários internamentos em hospitais psiquiátricos, onde conviveu com certos fármacos e eletrochoques .
E logo peregrinou pela cidade em companhia de boêmios, poetas , seres errantes e notívagos, sem nenhuma preocupação na esfera material. Quando necessitava de algo , simplesmente pedia , e tudo estava resolvido.
Caso vivesse na Grécia Antiga , Mário Gomes seria , por certo , um companheiro ideal para Diógenes que habitava um tonel e perambulava com uma lanterna à luz do dia a procura de um homem.
Mas , o inquieto poeta Mário Gomes, cedo percebeu que uma habitação convencional representaria para ele , uma sufocante prisão. A Praça do Ferreira acolheu amorosamente o poeta em sua breve existência terrena .
" Minha casa é meu corpo , meu carro também . Moro dentro de meus sapatos , ora ! Meu nome é pensamento ".
Em 2014 , o nosso poeta / boêmio / menino , encantou - se de vez . De que adianta agora chorar o riso , rir e engolir a lágrima do poeta , largado em sua morada sem teto num banco da Praça do Ferreira , devorado que foi por uma águia a lhe bicar o fígado, feito um Prometeu pós- moderno que tivera a insana coragem de se apropiar de versos , sob a guarda de encolerizados deuses do Olimpo.
Agora é tarde para cobrar das autoridades governamentais um mínimo de cuidados a um cidadão especial que não tinha condições de se manter sozinho , posto que , não sabia mensurar o perigo de viver. Para ele , sonho e realidade significavam o mesmo .
" Beijei a boca da noite / e engoli milhões de estrelas / fiquei iluminado/ bebi toda a água do oceano/ devorei as florestas / a humanidade ajoelhou - se a meus pés/ pensando que era a hora do Juízo Final / apertei com as mãos, a terra / derretendo - a / as aves em sua totalidade / voaram para o além/ os animais caíram do abismo espacial / dei uma gargalhada cínica/ e fui descansar na primeira nuvem / que passava naquele dia/ em que o sol me olhava assustadoramente/ fui dormir o sono da eternidade / e me acordei mil anos depois / por detrás do Universo ".
Comenta - se á boca - miúda que por ocasião da necropsia do bardo Mário Gomes , foi percebido que saíram a voejar do seu ventre aberto , um carrossel de rimas entremeados com coloridas borboletas e colibris.
Mário, cabreiro , deliciava - se com a cena , observando elas sumirem entre as nuvens do divino . Chegou a parolar com uma borboleta retardatária, mandando um recado para dois amigos : José Alcides Pinto ( 1923 - 2008 ) , e José Albano ( 1882 - 1923 ) , que em breve chegaria para empreender seu perpétuo caminhar caçando rimas e prosas para além do Universo .
" Quando eu morrer , irão distribuir minhas camisas , minhas calças , minhas meias , meus sapatos . As cuecas jogarão fora , ninguém usa cuecas de defunto. Irão vasculhar minha gaveta , vão encontrar muita poesia , documentos e documentários. Só sei dizer que foi gostoso viver , sentir o amor e proteção de minha mãe, de conhecer meus irmãos, meus amigos , de ver de perto as mulheres.
Só posso deixar escrito :
" Obrigado, vida ! ".
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domingo, 22 de janeiro de 2023

 Monteiro Lobato - Um Homem de Consciência

" Chamava - se João Teodoro , só . O mais pacato e modesto dos homens. Honestíssimo e lealíssimo , com um defeito apenas : não dar o mínimo valor a si próprio. Para João Teodoro , a coisa de menos importância no mundo era João Teodoro . Nunca fora nada na vida , nem admitia a hipótese de vir a ser alguma coisa . Mas João acompanhava com aperto de coração o desaparecimento de sua Itaoca .
- Isto já foi muito melhor , dizia consigo . Já teve três médicos , bem , agora , só um e muito ruinzote . Já teve seis advogados e hoje mal dá serviço a um rábula ordinário . Nem circo de cavalinhos bate mais por aqui.
Decididamente minha Itaoca está - se acabando .
- É isso , quando verificar que tudo está perdido , que Itaoca não vale mais nada , então arrumo a trouxa e boto - me fora daqui .
Um dia aconteceu a grande a grande novidade: a nomeação de João Teodoro para delegado . Delegado, ele ? Ele que não era nada , nunca fora nada , não queria ser nada ,não se julgava capaz de nada ...
Ser delegado numa cidadezinha daquelas é coisa seríssima.
João Teodoro passou a noite em claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada botou - as num burro, montou num cavalinho magro e partiu . Antes de deixar a cidade foi visto por um amigo madrugador.
- Que é isso , João ? Para onde se atira tão cedo, assim de armas e bagagens?
- Vou - me embora , respondeu o retirante . Verifiquei que Itaoca chegou mesmo ao fim.
- Mas como ? Agora que você está delegado ?
- Justamente por isso. Terra em que João Teodoro chega a delegado, eu não moro . Adeus!
E sumiu ."
Do livro Cidades Mortas , de 1919 , do gigante Monteiro Lobato ( 1882 - 1948 ) .
Muitos , como João Teodoro, mourejam em plagas abaixo do equador , mudos , bovinos , caminhando sem eira nem beira , passivamente , rumo ao abatedouro . Até os circos mambembes do planalto central , continuam com os mesmos velhos palhaços sem graça , repetindo piadas grosseiras , com palavras de baixo calão , e com os bolsos cheios de dólares sujos . Uma vergonha !
Alguns cidadãos desta pobre " Itaoca " , em 2023 , sonham em migrar para paraísos como EUA , Canadá ou Austrália . Ninguém , contudo , se arrisca mudar para Shangri - Las como Venezuela , Nicarágua , Chile , Argentina , Coreia do Norte ou Cuba .
Estes manés parecem tolos , mas não são loucos !
" A recusa em tomar partido em grandes questões morais é em si uma decisão. É uma adesão silenciosa ao mal . A tragédia do nosso tempo é que àqueles que ainda acreditam na honestidade falta fogo e convicção, enquanto aqueles que acreditam na desonestidade estão cheios de convicção apaixonada. "
Fulton Sheen ( 1895 - 1979 ) , Bispo Católico , Teólogo e Escritor .
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quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

 Amores Outonais : Apenas um Sonho

No encontro do Rio Pacoti com o Oceano Atlântico , no Porto das Dunas , um septuagenário casmurro , num cabuloso fim de tarde , curte aquele mágico momento de paz . Do nada , desponta em pura luz , como uma epifania , uma balzaquiana faceira , parecendo uma fada , com direito a varinha de condão , e tudo .
" Este seu olhar / quando encontra o meu / fala de uma coisa / que eu não posso acreditar / doce é sonhar , é pensar que você/ gosta de mim , como eu de você/ mas a ilusão quando se desfaz / dói no coração de quem sonhou , sonhou demais / ah ! se eu pudesse entender / o que dizem os seus olhos " . ( Este seu Olhar , de Tom Jobim ).
O solitário sonhador , num impulso , tenta erguer - se do paredão de pedras escorregadias , que brota da areia , e de pronto , foi contido pela prudente fada :
- Não , não ! , cuidado para não se machucar, meu vôzinho !
Danou - se ! Foi uma ducha de água fria no ardente e sonhador mancebo . Acabou ali , de chofre , aquele prelúdio de uma noite de verão !
" Meus cabelos cor - de - prata / são beijos de serenata / que a lua mandou pra mim/ os meus cabelos grisalhos/ são pingos brancos de orvalho/ num tinteiro de nanquim/ estes meus cabelos brancos / que hoje são da cor dos bancos / solitários de um jardim/ já sentiram muitos segredos / que elas contaram pra mim / se hoje , estão já desbotados / é porque foram beijados / com muito amor e emoção/ e os beijos foram tão puros / que os meus escuros / estão da cor do algodão / eu fiz tanta serenata / que a lua , desfeita em prata / mandou mil beijos pra mim/ e os beijos foram tão puros / que os meus cabelos escuros/ ficaram brancos assim ! " ( Cabelos Cor de Prata , de Rogaciano Leite ) .
É , vontade também consola :
" Dois amantes felizes não tem fim nem morte , nascem e morrem tanta vez enquanto vivem , são eternos como é a natureza " ( Pablo Neruda)
Ponto Final de um Sonho !
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domingo, 15 de janeiro de 2023

 O Ceará Não Tem Disso Não ?

Furacões e terremotos , representam medonhos desastres naturais que volta e meia , por conta de pressões exageradas, tendo a origem em placas tectônicas, ceifam inocentes almas humanas e destroem, impiedosamente , cidades por onde passam .
Trata - se de maldade da natureza ?
De forma nenhuma !
A natureza não dá a mínima bola para o bicho - homem . Ela em sua plenitude , imensidão e complexidade , não é boa nem má.
Apenas existe , e ponto final !
Em Pindorama , , especialmente no Ceará, neste período seco do ano , sopra uma brisa festeira , a levantar poeira , derrubando pé de pau envelhecido , jogando areia miúda nos olhos da negrada, trazendo à memória o mesmo incômodo causado por um inseto , o " lacerdinha " , que promovia uma incômoda ardência nos olhos dos transeuntes, ali pelos anos 60 do século passado.
Quando tal ventania alcançava a " esquina do pecado " , localizada na Praça do Ferreira, em Fortaleza , levantava , fescenino , as saias das estudantes secundaristas que desfilavam naquele logradouro , para deleite do canelau que batia ponto naquela redondeza .
Os furacões e terremotos , a despeito de acarretarem sérios danos , logo passam e a um custo elevado , permitem a recuperação dos danos infligidos . Pindorama desconhece tais desastres naturais , por situar - se distante das temíveis placas tectônicas, aquelas cascas de tartaruga que delimitam o chão da terra . Em contrapartida , convive com mazelas , verdadeiras calamidades provocadas por gente graúda de colarinho branco , toga e farda , que em conluio , nas caladas da noite , como representantes do povo , rasgam a Constituição Federal , desprovidos de qualquer senso de moralidade . Impõem ao país, perdas mais elevadas até que aquelas provadas pelos mórbidos eventos naturais , deixando Pindorama , próxima de de um colapso geral.
Parece repetitivo e banal , mas , ou se lava a jato o país à limpo , ou a derrocada vai ser fatal .
" O meu nome é Severino / não tenho outro de pia/ como há muitos Severinos/ que é santo de romaria/ deram então de me chamar Severino de Maria.../ somos muitos Severinos / iguais em tudo na vida / morremos de morte iguais em tudo na vida /na mesma cabeça grande/ que a custo se equilibra / no mesmo ventre crescido / sobre as mesmas pernas finas / e iguais também porque o sangue/ que usamos tem pouca tinta/ e se somos Severinos / iguais em tudo na vida / morremos de morte igual/ mesma morte Severina / que é a morte que se morre / de velhice antes dos trinta / de emboscada antes dos vinte/ de fome um pouco por dia / de fraqueza e de doença/ é que a morte Severina/ ataca em qualquer idade / e até gente não nascida ."
Excertos da poesia " Morte e Vida Severina " , do pernambucano João Cabral de Melo Neto ( 1920 - 1999 ).
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