domingo, 28 de junho de 2020

Brasil, Um Imenso Hospital : Ontem X Hoje
"Vivemos tristemente em um país triste. As nossas desfeitas políticas e as nossas misérias administrativas cedo , apenas conscientes da vida nacional , nos envenenam as fontes de alegria, de onde deveriam haurir reservas de energias físicas e morais indispensáveis à nossa dignidade de povo independente... fora do Rio ou de São Paulo , capitais mais ou menos saneadas, e de algumas outras cidades em que a previdência superintende a higiene, O BRASIL AINDA É UM IMENSO HOSPITAL...porque a Pátria, que lhes negou a esmola do alfabeto, lhes pede agora a vida e nas mãos lhes punha , antes do livro redentor, a arma defensiva ".
Excertos de uma palestra proferida em 10 de outubro de 1916, por Miguel Pereira (1871 - 1918 ), médico sanitarista brasileiro, professor universitário e membro da Academia Nacional de Medicina do Rio de Janeiro .
Esta vigorosa mensagem patriótica exarada há mais de um século, ainda permanece atual e , penosamente , verdadeira. Continuamos como um grande e mal gerido hospital, cheio de puchadinhos feito às pressas, em lugares impróprios, com novas e furtivas mazelas: o "cancro medonho da corrupção", e uma fileira de infecções como , Aids, Dengue , Chikungunya, Zika, e COVID - 19.
Pindorama segue manietado, letárgico, assistindo aos três poderes republicanos se digladiarem em torpes pelejas.
Até quando ?

sábado, 27 de junho de 2020

Areia - Gafanhoto - Chuva
O dia raiando neste sábado na "loura desposada do sol" . O olhar matuto faz a varredura pelo vasto céu, e nada da tal nuvem de poeira 'Godzilla', vinda da África com seu maléfico conteúdo: milhões de toneladas de partículas respiráveis , turbinadas com bactérias, vírus, fungos , ferro, mercúrio, e pesticida. Que horror!
De quebra , aguardando a tal da nuvem de gafanhotos oriundos da Argentina.
Qual nada , miséria pouco é tiquim !
O rei - sol ainda não deu o seu ar da graça, enquanto nuvens carrancudas despejam o milagroso líquido salvador do nosso esturricado chão, sob as ordens de São Pedro , e bem ali, o Rio São Francisco, o 'Velho Chico' chega amoroso , jorrando 'ouro líquido', enfim , no Ceará.
Comemoração matinal sugerida: um bom banho daquele de encharcar a alma , expurgando toda impureza , acompanhado, se possível, de dois dedinhos de cana com uma seriguela, que ninguém é de ferro!
Carpe diem!

quarta-feira, 24 de junho de 2020

Beijando cada Palavra
"Um leitor me fez, à máquina sob o pseudônimo de Aurélio, a mais curta das perguntas : "O Amigo reza ?"
Usou papel de carta e envelope. Mais ainda : a via postal.
Por que o meu interlocutor deseja saber se oro, se levanto a Deus meu espírito?
Se se lhe aguça a respeito a curiosidade, por que não pôs, na sua missiva, um endereço qualquer, para uma resposta particular ou sigilosa ?
De onde concluo que o seu desejo é provocar - me para algumas palavras nesta coluna em torno do assunto...
Rezo. E não me envergonho de dizê- lo . Pelo contrário: ufano - me até...
Rezo. Mas estou longe , bem longe de rezar como muitos rezam, isto é, em quantidade e qualidade desejáveis. Há quem não se canse de procurar a Deus , escolhendo a melhor parte. E há quem cansado , surrado, moído, quase incapacitado de rezar, assim mesmo ainda reza e se vale dos céus, numa peroração, num holocausto admirável, empolgante.
Há, por exemplo, Aurélio, no Leprosário Antônio Diogo, uma mulher extraordinária, que a doença derrubou, decepou, corroeu ao máximo, mas em quem a fé é uma labareda viva, capaz de aquecer, de longe, até mesmo a possível frieza religiosa do seu e do meu coração.
Essa mulher já não tem as mãos nem os dedos dos pés. Todo o seu rosto está desfigurado. Só possui, coitada , sensibilidade ou tato nos lábios. Pois bem. Sabe como ela reza o terço de Nossa Senhora?
Dependurando - o na boca, onde debulha conta por conta, num resmungo que vem do coração.
Isto , sim é que é rezar. Beijando cada Palavra!"
Excertos da crônica " Beijando cada Palavra " , que integra o livro " Minha Máquina, meu Piano " , 1989, da autoria de João Jacques Ferreira Lopes (1910 - 1999 ) , jornalista ,cronista , poeta, pintor, nascido em Fortaleza . Membro da Academia Cearense de Letras , onde ocupou a Cadeira 28, da Academia Cearense de Jornalismo , e da Academia Cearense de Retórica.

terça-feira, 23 de junho de 2020

O Amigo da Onça
Péricles de Andrade Maranhão (1924 - 1961 ) , nasceu no dia 14 de agosto de 1924 , na cidade de Recife, em Pernambuco. Desde cedo , estudante do Colégio Marista , o petiz vivia metido com pincéis, tintas e desenhos.
Certa feita , com 16 anos de idade, Péricles, procurou o Jornal " Diário de Pernambuco" , carregando debaixo do braço uma farta amostra de desenhos bem elaborados. O jornalista que o recebeu , Aníbal Fernandes , após breve análise dos trabalhos , de pronto o encaminhou para o diretor da Revista " O Cruzeiro " , Leão Gondim de Oliveira , no Rio de Janeiro. Contratado como contínuo, logo se viu cercado com monstros sagrados da imprensa nacional , como Millôr Fernandes, David Nasser e Assis Chateaubriand , dentre outros.
No ambiente da Revista " O Cruzeiro " foi gestado o personagem " O Amigo da Onça " , baseado em " El enemigo del Hombre " pertencente a uma revista argentina . Saiu pronto um tipo traiçoeiro, amigo falso , irônico e dissimulado , vestido num impecável Summer - Jacquet branco, sempre criando situações embaraçosas. Virando em pouco tempo , uma das principais atrações do importante semanário , durante cerca de 18 anos.
A fama subiu à cabeça daquele jovem pernambucano que passou a frequentar o mundo boêmio carioca , donde colhia um farto material para suas histórias com malandros , garçons e mulheres da noite.
Péricles era contudo, um tipo introvertido , solitário, depressivo, que buscou amparo na bebida alcoólica, resultando em sérios prejuízos à sua vida familiar e profissional.
Casou - se com Angélica Maranhão que lhe deu um filho , posteriormente tornado um neurologista de renome.
No dia 31 de dezembro de 1961 , Péricles de Andrade Maranhão terminou seu périplo terreal , deixando três mensagens : uma para sua mãe, outra " A quem interessar possa" :
" São precisamente 14h30m do dia 31 de dezembro de 1961. Estou completamente sóbrio e não desejo culpar ninguém pelo meu gesto. Apenas , estou me sentindo profundamente só. Os amigos, se assim posso chamá - los, estão em suas casas, junto a suas famílias, o que não acontece comigo, pois a única família que possuo - minha querida mãe e irmã- está em Recife. Aqui , no Rio , não possuo um único parente, a não ser meu filho que se encontra com a mãe, pois sou desquitado e a mesma falou - me que iria passar o Ano - Novo com a família dela, em Recife, pois são também pernambucanos.
Conclusão: sou profundamente sentimental e nunca passei essa época sem uma palavra de carinho. Apenas a solidão me levou a este ato extremo. Talvez assim as coisas melhorem para todos "
Um terceiro aviso escrito num papel de embrulho , lacônico , dizia :
" Cuidado . Não risque fósforos. É gás ".
Ligou o gás do forno , para desligar o fio da vida , antes fechando todas as janelas e portas do apartamento .
Partiu , aos 37 anos , vestido de terno branco , gravata e sapatos preto, em busca da paz numa outra dimensão.
A missa de sétimo dia foi oficiada pelo cearense Dom Hélder Câmara.

sexta-feira, 19 de junho de 2020


Turma de Medicina 1973 da UFC , Saudades
Doutorandos da Turma de Medicina de 1973 , UFC, cursando o Internato no Hospital Geral Dr. César Cals.
Na foto , nominando os queridos irmãos para sempre , da fileira superior para a inferior e da esquerda para a direita :
Ribamar, João Batista , Bezerra , Marcos Aurélio, Haroldo , Airton, Araripe , Ventura , Egberto , Ítalo, Diderot.
Eleutério, Edimar, Gilson, Clemente , Nazareno, Paulo Silva, Irapuan , Paulo Pedro, César, Clodiomar, Simões.
Francy Mary , Tereza Neuma , Sildete, Irene , Helena , Analba.
Humildes Filhos de Hipócrates que continuam prescrevendo ervas, lancetando tumores , curando feridas do corpo e da alma auscultando , com infinita paciência e zelo, o clamor de nossos irmãos que conosco compartilham desta deslumbrante aventura terrestre.
Carpe diem quam minimum credula postero.
"Você trabalha para acompanhar o ritmo e a alma da terra. Pois ser ocioso é se tornar um estranho para as estações e sair da procissão da vida, que marcha em majestosa e orgulhosa submissão rumo ao infinito.
Quando trabalha, você é uma flauta em cujo coração o sussurro das horas se transforma em música.
Quando trabalha , você realiza uma parte do sonho mais distante da terra, que lhe foi atribuído quando esse sonho nasceu.
E sempre trabalhando, na verdade, você está amando a vida, e amar a vida por meio do trabalho é ser íntimo do mais íntimo segredo da vida.
Não é durante o sono, e sim na vigília do meio - dia , que o vento fala com os gigantescos carvalhos com tanta doçura quanto com a menor folha de grama.
E ele é a grandeza que transforma a voz do vento em uma canção suavizada por seu próprio amor .
Trabalho é o amor se tornando visível.
Trabalho é amor " (Kahlil Gibran ).

quinta-feira, 18 de junho de 2020


Peter Medawar , Nobel de Medicina , 1960
Peter Brian Medawar ( 1915 - 1987 ) , veio ao mundo no Hospital Santa Teresa em Petrópolis (Rio de Janeiro) no dia 12 de fevereiro de 1915. Seus pais foram a inglesa Edith Muriel Dowling e o libanês Nicholas Medawar. O petiz foi registrado na Embaixada do Reino Unido , com fins de se tornar um cidadão britânico nato. Terminou , deste modo com dupla cidadania .
Aos 14 anos de idade , Peter Medawar, segue para fixar , definitivamente, residência em Londres. Aos 17 anos , o jovem Peter foi admitido em Oxford , onde graduou - se em Zoologia . Ali aprofundou seus estudos em biologia médica, descobrindo os mecanismos de tolerância imunológica adquirida e da imunomodulação com corticoides , abrindo possibilidades para os iniciantes transplantes de rim , fígado, pulmão e coração.
Peter Medawar e seu parceiro Frank Burnet foram galardoados com o Prêmio Nobel de Medicina no ano de 1960.
Em 1962 , Peter Medawar , retornou ao Brasil para uma visita de saudade a sua cidade natal , Petrópolis, onde foi alvo de significativas homenagens .
Em 1965 , Peter Medawar recebeu o título de Sir , pela Rainha Elizabeth II.
Em 1969, o nobre cientista, aos 54 anos , foi acometido por um grave Acidente Vascular Hemorrágico, tendo sobrevivido , ainda , por cerca de 18 anos . Em 2 de outubro de 1987, não resistiu a um novo agravo cerebral.
Neste meio termo , Peter Medawar, durante a ditadura do "pai dos pobres" Getúlio Vargas, teve sua cidadania brasileira perdida , por ordem do Marechal Eurico Gaspar Dutra , Ministro da Guerra , por não atender ao chamado para prestar serviço militar obrigatório no Brasil.
Que pena !
Alguns estudiosos atribuem pouco "peso brasileiro" à figura de Peter Medawar, assinalando que ele era mais inglês do que qualquer outra coisa ( Albuquerque , J. L. ).
Uma vez mais a Nação Brasileira passa ao largo do cobiçado Prêmio Nobel outorgado pelo Instituto Karolinska de Estocolmo.
Até quando ?

Miriápodes x Acéfalos
Logo que o rei - sol risca o céu em sua carruagem de ouro, um idoso dá início a suas atividades laborais junto a fraternos irmãos: dois coelhos , um jabuti e alguns peixes ornamentais. Enfim , um Francisco , neste seu pequeno mundo .
Um convidado de última hora , muito bem acolhido , serpenteando, se apresenta , um mimoso piolho - de- cobra , também dito , embuá , aquele que se enrosca ao ser tocado , como uma auto - defesa natural.
Trata - se de um miriápode ( um ser com muitas pés).
Aos poucos chegam aos ouvidos do velho franciscano, um parlatório de seres fanatizados, babando ódio e trombeteando o final dos tempos , a terrível batalha do Armagedom.
O discurso monocórdico, rebarbativo , que descaracteriza e banaliza termos como : " meninas" , "vamos repercutir ", força- tarefa" , " pico da doença " , "antidemocrático " , dentre outros.
Parece algo tosco , disforme , oriundo de seres destituídos de massa encefálica, amparados em "soturnos corvos " que se acreditam semideuses , coitados.
Exemplos metafóricos de miriápodes e acéfalos.

terça-feira, 16 de junho de 2020


Batom no Espelho e Quase Sangue
O servidor público e boêmio Orisvaldo da Silva, tirou licença- prêmio do famigerado Bar da Alegria , onde comumente animava uma roda brega - romântica com uma fiel imitação do cantor taurino pernambucano Orlando Dias , de saudosa memória.
"Tu és a criatura mais linda que os meus olhos já viram/tu tens a boca mais linda que a minha boca beijou/são meus os teus lábios/estes lábios que os meus desejos mataram /são minhas tuas mãos/estas mãos que minhas mãos afagaram/sou louco por ti/eu sofro por ti/te amo em segredo/adoro o teu porte divino/pela mão do destino/a mim tu vieste/tenho ciúme do sol , do luar, do mar/tenho ciúme de tudo/tenho ciúme até da roupa que tu vestes"
Na Autarquia do Estado, onde prestava serviço há trinta anos , Orisvaldo, andava agora casmurro e cabisbaixo. Acomodava em sua cadeira de trabalho, o surrado paletó de linho branco "que até o mês passado lá no campo ainda era flor" , como na modinha de Fagner e Belchior, e escorregava de fininho para um boteco próximo com o intuito de sorver umas "sapuparas" com pitombas de vez.
Há coisa de seis meses, Jussara , uma cabocla maranhense, uma reluzente estampa do tipo rainha de bateria do bloco Unidos do Acaracuzinho, que batia ponto na Boate Continental , assinara contrato verbal com o boêmio Orisvaldo, no quesito fogo de paixão.
Tudo quase foi água abaixo quando , um desinfeliz segredou para Orisvaldo que estavam mexendo com sua ovelha cabocla.
Numa rápida busca pela "feira dos malandros" , Orisvaldo conseguiu um Taurus 38 , com numeração raspada, e pronto para cuspir fogo. Naquela noite, Orisvaldo e Jussara , partiram para uma peleja amorosa. Foi uma contenda e tanto , com direito a prorrogação e mata - mata. Orisvaldo em pleno nocaute técnico, deu bobeira deixando , inocentemente , à mostra , o pau - de- fogo em cima da penteadeira. Jussara , faceira e não besta, escafedeu- se postando uma breve mensagem no espelho do quarto , com batom , partindo para um lugar incerto e não sabido, ademais , seguro morreu de velho.
Orisvaldo , fique frio , isso se trata de coisa saindo de sua cabeça!

segunda-feira, 15 de junho de 2020


Cantares , de Antônio Machado
"Tudo passa e tudo fica
Porém o nosso é passar,
Passar fazendo caminhos
Caminhos sobre o mar.
Nunca persegui a glória
Nem deixar na memória
Dos homens minha canção
Eu amo os mundos sutis
Leves e gentis,
Como bolhas de sabão.
Gosto vê-los pintar - se
De sol e grená voar
Abaixo o céu azul , tremer
Subitamente e quebrar - se...
Nunca persegui a glória
Caminhante , são tuas pegadas
O caminho e nada mais;
Caminhante , não há caminho,
Se faz caminho ao andar.
Ao andar se faz caminho
E ao voltar a vista atrás
Se vê a senda que nunca
Se há de voltar a pisar.
Caminhante não há caminho
Senão há marcas no mar...
Faz algum tempo neste lugar
Onde os bosques se vestem de espinhos
Se ouviu a voz de um poeta gritar
"Caminhante não há caminho,
Se faz caminho ao andar "...
Golpe a golpe, verso a verso...
Morreu o poeta longe do lar
Cobre - lhe o pó de um país vizinho.
Ao afastar - se lhe vieram chorar
"Caminhante não há caminho,
Se faz caminho ao andar ..."
Golpe a golpe, verso a verso...
Quando o pintassilgo não pode cantar.
Quando o poeta é um peregrino.
Quando se nada nos serve rezar.
"Caminhante não há caminho,
Se faz caminho ao andar..."
Golpe a golpe , verso a verso ".
Cantares, de autoria do poeta espanhol Antônio Machado (1875 - 1939), pertencente ao Movimento Modernista.

domingo, 14 de junho de 2020

Reencontro com a Liberdade
Neste fim de tarde de sábado no Porto das Dunas , matando a saudade do mundo dos mares bravios , e que ninguém - ainda - conseguiu prender. Ah Bicho - homem !
"Bons comandantes não ostentam bravura.
Bons guerreiros não se encolerizam.
Bons vencedores não competem com os inimigos.
Bons líderes permanecem abaixo dos homens.
Isso se diz a virtude da não disputa.
Isto se diz o poder de liderar as pessoas.
Isso se diz a antiga e sublime sintonia com o Céu.
Existe a dificuldade de governar o povo,
porque os superiores intervêm em demasia.
Eis o motivo do desgoverno.
Somente quem não intervém na vida
É virtuoso em estimar a vida "
O Livro do Tao , de Laozi.