domingo, 29 de outubro de 2017

CEARENSIDADE EM VERSOS MUSICAIS


Para o poeta Dirceu Vasconcelos


Catando rimas em poemas que se misturaram com melodias talhadas por mãos de genuínos filhos da Terra da Luz e que ganharam a estrada, riscando o chão feito coió, adornando o rico universo da Música Popular Brasileira.
Segue um tiquinho da amostra enaltecendo estes grandes menestréis cabeças-chatas:
“Eu quero é que este canto torto, feito
faca, corte a carne de vocês”
(A palo seco, Belchior)
“A minha alucinação é suportar o dia a dia e o meu delírio é a experiência com coisas reais” (Alucinação, Belchior)
“Marilyn, Greta, Marlene, deusas que eu amei com as mãos”
(Beijo molhado, Belchior)
“Até à manhã, se houver amanhã, se eu vir a manhã mando alguém dizer como é”
(Até à manhã, Belchior)
“Vida, eu quero me queimar no teu fogo sincero” (Brincando com a vida, Belchior)
“Na parede da memória essa lembrança é o quadro que dói mais”
(Como nossos pais, Belchior)
“Meu bem, guarde uma frase pra mim dentro da sua canção, esconda um beijo pra mim sob as dobras do blusão “
(Coração selvagem, Belchior)
“Quando eu estou sob as luzes, não tenho medo de nada”
(De primeira grandeza, Belchior)
“Ah! mas como é triste essa nossa vida de artista, depois de perder Vilma pra São
Paulo, perder Maria Helena pra um dentista”
(Enquanto engoma a calça, Ednardo e Climério).
Este último nascido no Piauí, onde junto com os irmãos Clodomir e Clésio, contribuíram para o enriquecimento das noites musicais cearenses.
“As velas do Mucuripe, vão sair para pescar. Vou mandar as minhas mágoas pras águas fundas do mar”
(Mucuripe , Belchior e Fagner)
“Calça nova de riscado, paletó de linho branco que até no mês passado lá no campo inda era flor”
( Mucuripe, Belchior e Fagner)
“Sofrer de amor pra mim é morrer, eu sou um sonhador, e você?” (Fracasso, Fagner)
“Se hoje eu sou deserto é que eu não sabia que as flores com o tempo perdem a força e a ventania vem mais forte”
( Noturno , Graco e Caio Sílvio)
“Eu tenho medo de abrir a porta que dá pro sertão da minha solidão” (Pequeno mapa do tempo, Belchior)
“Quanto mais eu tento ver meu rosto dentro do espelho, mais você enche meus olhos de saudade”
(Presente, David Duarte)
“Quem não tem sucesso ou grana tem que ter sorte bastante para escapar salvo e são das balas de quem lhe quer bem”
( Ter ou não ter, Belchior)
“Sou o teu caso presente, sou teu futuro ausente, passado que não vai voltar” (Petrúcio Maia e Abel Silva). Este último, Abel Silva, poeta e compositor carioca.
“Se o passado é tão presente em cada instante, cada cena não é passado , é somente minha vida que estancou”
(Vertigem de Graco e Caio Sílvio)
“O meu grito nega aos quatro ventos, a verdade que eu não quero ter”
(Beira-mar, Ednardo)
“A vida não separa, a vida simplesmente afasta” (Bem perto, David Duarte)
“Mas é você que ama o passado e que não vê que o novo sempre vem”
(Como nossos pais, Belchior)
“Mamãe, quando eu crescer eu quero ser rebelde se conseguir licença do meu broto e do patrão” (Dandy, Belchior)
“Cantar para quem não vai me ouvir, sentar na estrada, contar o meu dinheiro, arrumar o cabelo e seguir!”
(Frio da serra, Petrúcio Maia e Brandão)
“Não sou feliz, mas não sou mudo, hoje eu canto muito mais”
(Galos, noites e quintais, Belchior)
“Quero escutar o que a tua boca não diz, viver o que te percorre as veias” (Natureza dos oceanos, David Duarte, Felipe Cordeiro)
“Não acredito mais no fogo ingênuo da paixão” (Noturno, Graco e Caio Sílvio)
“E as paralelas dos pneus na água das ruas, são duas estradas nuas em que foges do que é teu” (Paralelas, Belchior)
“Que olhar esconde o viço dos teus lábios já sem cor?”
(Pé de sonhos, Petrúcio Maia e Brandão)
“Vivia o dia e não o sol, a noite e não a lua”
(Pequeno perfil de um cidadão comum, Belchior)
“Graças a Deus, eu perco sempre o juízo” (Recitanda, Belchior e Graco)
“Brilha um punhal em teu olhar, sinto o veneno do teu beijo, era moderno o meu batom”
(Retrato marrom, Rodger Rogério e Fausto Nilo)
“Vejo a manhã de sol entrando em casa iluminando o grito das crianças”
(Retrovisor, Fagner e Fausto Nilo)
“A paixão que enlouquece os meus dias adormece nos olhos de alguém”
(Último trem, Fagner e Fausto Nilo)
Ponto final!

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

O CORPO FALA, A ALMA GEME



O cabelo em desalinho, o rosto vincado com profundas rugas, o olhar baço, catando a poeira do chão, ou perdido na imensidão do infinito;

Os ombros caídos e curvados, o andar arrastado, um cigarro preso entre os dedos indicador e médio, amarelados e trêmulos pelo veneno da nicotina: eis um corpo falando por si só e a alma gemendo baixinho, alertando o teimoso bicho-homem sobre o perigo que ronda sua saúde.

O corpo humano exibe, às claras, uma miríade de sinais e sintomas de que algo está em desconformidade com a natureza: palidez pétrea, sudorese pegajosa, tremor das extremidades, boca seca, coração disparado, a voz estaca, o intestino se solta, e a bexiga trava.

A bexiga, este órgão de choque, um saco tênue, se presta para guardar, temporariamente, escórias que são filtradas pelos rins, até serem eliminadas para evitar uma certeira intoxicação. Na presença de grandes conflitos pessoais ou em graves pendências na vida do ser humano, pode ocorrer uma obstrução urinária aguda, necessitando de uma sondagem vesical de alívio. Deve-se seguir adiante em busca de um diagnóstico definitivo, como um aumento da próstata por conta da idade avançada ou de algum tumor benigno ou não.

Cumpre a todos os homens com idade superior a 40 anos realizarem exames periódicos com médicos especialistas visando a avaliação do estado de sua próstata:

uma elaborada história familiar e pessoal de câncer, a realização de um toque retal, exames de sangue, incluindo PSA (antígeno prostático) e estudos de imagem (ultrassom, tomografia computadorizada e ressonância magnética) são de importância ímpar.

A estimativa do Instituto Nacional do Câncer (INCA) para 2017 são de 61.200 novos casos de câncer de próstata. Cerca de 1 em 7 homens será diagnosticado com câncer de próstata durante a vida. A média de idade no momento do diagnóstico é de 66 anos. Cerca de 1 em 39 homens morrerá de câncer de próstata, embora a maioria dos homens diagnosticados com a tal doença, morrem por outros motivos.

A questão da doença e da cura passa pela polaridade: a doença é a polaridade; a cura é a vitória sobre a polaridade (Dahlke, R.)

“Quando de dois fizerdes um, e quando transformardes o interior em exterior e o exterior em interior; quando o superior for como o inferior, e quando fizerdes o masculino e o feminino uma só coisa, de tal forma que o masculino não seja masculino e o feminino não seja feminino; quando fizerdes olhos no lugar de um olho e uma mão no lugar de uma mão, e um pé no lugar de um pé, uma imagem no lugar de uma imagem, então entrareis no reino (Evangelho de Tomé, Log.22)





quinta-feira, 26 de outubro de 2017






Não pode mirar a lua sem calcular a distância.
Não pode mirar uma árvore sem calcular a lenha.
Não pode mirar um quadro sem calcular o preço.
Não pode mirar um menu sem calcular as calorias.
Não pode mirar um homem sem calcular a vantagem.
Não pode mirar uma mulher sem calcular o risco.

" Janela sobre um homem de êxito " do mago Eduardo Galeano (1940-2015), retirado do livro " As Palavras Andantes" - 1993.





Acta est fabula. Argumentum ad crumenum. Abysmus abysmun invocat. 
Traduzindo : A peça foi representada. O argumento da bolsa. O abismo chama o abismo.
Esta noite, uma nação inteira, cabisbaixa e enxovalhada assistiu aos representantes do povo darem seus votos a favor de legitimar a corrupção. 
Resta somente : Argumentum baculinum ( o argumento do cacete). 
Acorda Brasil !

domingo, 22 de outubro de 2017

UMA ANTIGA FÁBULA DE HYBRIS





Num burgo perdido nos confins do mundo, onde o cão perdeu as botas, sempre à espera de um futuro incerto que nunca bate à porta, vivia um casal que abrigava um insaciável desejo sem limites. Ele um idoso sisudo, com rosto pétreo, vertendo uma linguagem empostada e monocórdica; e ela um mimoso bibelô, frágil e elegante, exibindo uma exemplar e incômoda mudez. Em certa ocasião, uma daquelas “lâmpadas mágicas das histórias das mil e uma noites orientais” cai nos gentis braços da dita dama. O marido, já cioso dessas fábulas contadas no país de seus ancestrais, logo tomou a dianteira.

Solicitou, sem demora a providência de um palácio luxuoso numa área até então inabitada. E assim foi feito. Salta do nada um luxuoso prédio com traços ultramodernos.

Não satisfeitos, segue-se um novo pedido para a lâmpada maravilhosa, posto que, os pombinhos queriam ser, simplesmente, rei e rainha, respectivamente.

Mas, como o desejo não tinha limites, decorrido pouco tempo, surge um novo e estrambótico desejo: o velho sisudo e manhoso, queria ser papa. Uma vez mais a lâmpada cedeu à solicitação que tinha tudo para dar errado:

Seria um papa franciscano de pés descalços, despojado, que conversava com os bichos, porém, muito à esquerda e fiel defensor da libertação dos pobres do mundo. Assim foi feito e, como era de se esperar, pouco durou a trajetória papal.

O idoso inquieto e insaciável, queria, simplesmente, ser um deus, daqueles greco-romanos, mesmo que preciso fosse acabar com toda a riqueza e decência existentes naquele pobre burgo. Pedido, enfim, aceito.

A rainha-bibelô voltou ao palácio para transmitir as alvissareiras notícias e, aturdida, visualizou um triste e apocalíptico cenário:

O outrora palácio transformado em uma choupana, mostrando um pobre idoso, maltrapilho, cabisbaixo, algemado, sentado num tamborete grogue, tendo ao lado um tipo mau encarado, com traços nipônicos, óculos escuros, protegendo a pobre presa.


Voltara a tudo como dantes, à estaca zero, e segundo confidenciara o verdugo japonês, o destino final seria rumo a um sinistro lugar denominado “ Inferno da Papuda”.

Que pesadelo medonho, senhores!



sexta-feira, 20 de outubro de 2017

CRÔNICA DA AVESTRUZ




Num passado não muito distante, com a imprensa amordaçada por um governo discricionário, alguns jornais publicavam inocentes receitas de bolo, no lugar de crônicas ácidas ao regime político então vigente. Deste modo, foram silenciadas vozes altivas como as de Carlos Heitor Cony, Millôr Fernandes e Sérgio Porto, dentre outras. Nos temerários dias atuais, a colenda “ Casa do Povo”, também dita “ Casa de Mãe-Joana”, ocupada por gente, em geral, alheia aos anseios dos inocentes eleitores, em conluio com setores do Palácio do Planalto, habitado por criaturas estranhas e soturnas, cercadas de malas com conteúdo explosivo, e em completa desconexão com os desejos de 97% da população pacata e bovina, confeccionam às caladas da noite, um desastre de grandes proporções prestes a irromper.

Na loira desposada do sol, um insosso jornal televisivo que mama, sôfrego, nas tetas governamentais, passa o dia destilando abobrinhas para anestesiar a mente de seus inocentes telespectadores, e tome imagens das avenidas mostrando o fluxo de veículos automotores, além de fotos de crianças e de adultos com seus animais de estimação. Uma pândega! O dia a dia das notícias políticas é empurrado para baixo do tapete, contribuindo de forma decisiva com a reinante alienação do populacho.

No antigo regime das armas, a mordaça fazia-se às claras, na força bruta, e no atual desgoverno, sutilmente, o tapa-boca é movido a grana in natura abarrotando malas para os fiéis aliados, umas ratazanas de grande porte.

Que tal, curtir um sonífero, um velho artifício da oferta gratuita do pão e circo para aliviar a dor e esquecer a sensação de impotência diante destas barbáries?

“ Certa feita, um casal adentra num consultório odontológico. Ela, uma gentil e frágil dama e ele, um brutamontes tatuado com uma infinidade de dragões pelo corpo sarado. O dentista nem teve tempo de falar, pois o cliente logo mandou bala:

- Vou logo avisando, doutor, não precisa aplicar nada de anestésico. Arranque o dente, logo e estamos conversados.

- Ah, se meus clientes fossem assim, estoicos e guerreiros como o senhor, falou o dentista. - Qual é o dente que o incomoda?
O machão musculoso vira para a esposa e verbera: - abre a boca mulher! ”

Pode a escolha do povo, recair sobre a atitude da avestruz escondendo a cabeça numa fuga da realidade, mas o trem da democracia verde-amarelo desce o desfiladeiro, sem freio e sem maquinista, desembestado rumo a um inevitável e medonho desastre.

Acorda, Brasil, 2018 pode ser tarde demais!







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quarta-feira, 18 de outubro de 2017



DIA DO MÉDICO – UMA LEMBRANÇA: 2017


Desde o primeiro vagido de dor do homem nas cavernas, perdido nos desvãos do mundo pretérito surge em cena a figura do sanador, xamã, sacerdote e, por fim, do médico.
Hoje, após peregrinar por ínvios caminhos, evidencia-se um cidadão de branco, imbuído do ideal supremo de mitigar dores, curar feridas, lancetar tumores, amenizar angústias e salvar vidas de seus queridos irmãos de jornada terreal. Apenas isso e, no entanto, um mundo de quefazeres.
O exercício da medicina, a despeito de tanta controvérsia, faz-se uma ciência/ arte, e não um comércio; uma vocação, e não um negócio; um sublime ofício onde sempre o coração emanará a derradeira ordem.
Àqueles irmãos de jaleco branco, cuidadores das dimensões físicas, mentais e espirituais das pessoas, nossa mensagem de sincero apoio e veraz respeito. Tenhamos todos a certeza plena que a ciência nos faz fortes, porém, não necessariamente melhores. O humanismo é quem nos oferta a compreensão do homem em suas aspirações e misérias, ensejando a valorização do que é bom, do que é belo e do que é justo na vida.
Lutemos todos irmanados pelo fim das desigualdades, frutos do egoísmo e da rapina, incrustados no seio de alguns seres humanos, para enfim assistir:
A liberdade de viver sem temor,
A liberdade de viver sem carências,
A liberdade para viver com dignidade.
A equidade em saúde deve ser vista como o ar, que nos pertence a todos!
Queridos colegas, sempre será um privilégio contar na faina diária com suas ricas presenças, compartilhando saberes e sorvendo lições dos senhores, de como viver uma vida direcionada a compaixão de todos os seres sencientes, razão maior de nossa passagem por este mundo.
Parabéns, doutores, pelo seu dia, e que Deus lhes abençoe e guarde!

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

DIA DOS ANJINHOS





Dia 12 de outubro, povoando os cruzamentos de avenidas nos bairros ricos de Fortaleza, ano após ano, a triste cena se repete, comove e clama por um fim. Uma legião de anjinhos, famélicos, esfarrapados, estende a mão num silêncio ensurdecedor, expondo uma chaga aberta no peito há séculos: a cruel injustiça social. Um verdadeiro tapa na cara daqueles que planejam os falidos programas de esmolas, incluindo as tais famigeradas bolsas. Esses pobres anjinhos serão um dia, não distante, alcançados pela cruel máquina de triturar gentes, morrendo prematuramente de susto, bala ou vício.

“A esta hora exatamente/há uma criança na rua/há uma criança na rua/é honra dos homens proteger o que cresce/cuidar que não haja infância dispersa pelas ruas/evitar que naufrague seu coração de barco/sua incrível vontade de pão e chocolate/colocar uma estrela no lugar da fome/caso contrário é inútil, caso contrário é um absurdo/ensaiar na terra a alegria e a música/porque de nada vale, se há uma criança na rua”.

“ Todo o tóxico do meu país entra pelo meu nariz/lavo carros, limpo sapatos, cheiro cola e também uso crack/roubo carteiras, mas sou gente fina, sou um sorriso sem dentes/chuva sem teto, unha com terra, sou o que sobrou da guerra/um estômago vazio, um golpe no joelho que se cura com o frio/o melhor guia turístico da redondeza/por três moedas te guio pela capital/não preciso de visto para voar pelos arredores/porque brinco com aviões de papel/arroz com pedra, frango com vinho, e o que me falta eu imagino/não deve andar o mundo com amor descalço/acenar com um jornal com uma carta na mão/subindo nos trens, substituindo o riso/batendo-nos no peito com um lado cansado/não deve andar a vida recém-nascida, a preço/a infância arriscada por uma extrema ganância/porque, então, as mãos são fardos inúteis/e o coração, apenas uma pobre palavra/quando cai a noite, durmo acordado, com um olho fechado e o outro aberto/porque senão os tigres me mandam um balaço/minha vida é como um circo, mas sem palhaço/vou caminhando pelas ruas fazendo malabares com cinco laranjas/pedindo moedas a todos numa bicicleta de uma só roda/sou oxigênio para este continente/sou o que o presidente descuidou/não se assuste se tenho mal hálito, se me vês sem camisa com as tetas ao vento/sou um elemento a mais na paisagem/os resíduos da rua sem camuflagem/como alguma coisa que existe, mas de mentira/algo sem vida, mas que respira/pobres são aqueles que se esqueceram de que há crianças na rua/que há milhões de crianças que vivem na rua/e muitas crianças que crescem nas ruas/eu os vejo apertando seu pequeno coração/mirando-nos a todos com uma fábula nos olhos/um relâmpago truncado cruza seus olhos/porque ninguém protege a vida que cresce/e o amor faz-se perdido, como uma criança solta na rua “.

Tradução livre da música “ Hay un niño en la calle”.



terça-feira, 10 de outubro de 2017

"Os adultos fazem negócios. /têm rublos nos bolsos. /quer amor? Pois não! /ei-lo por cem rublos!/e eu, sem casa e sem teto, /com as mãos metidos nos bolsos rasgados, /vagava assombrado. /à noite /vestis os melhores trajes /e ides descansar sobre viúvas ou casadas./a mim/Moscou me sufocava de Abraços /com seus infinitos anéis de praças /nos corações, nos relógios /bate o pêndulo dos amantes./como se exaltam as duplas no leito do amor!/eu, que sou a Praça da Paixão. /surpreendo o pulsar selvagem/do coração das capitais/desabotoado, o coração quase de fora, /abria - me o sol e aos jatos d'agua. /entrai com vossas paixões! /galgai-me com vossos amores!/doravante não sou mais dono de meu coração! /nos demais -eu sei,/qualquer um o sabe-/o coração tem domicílio no peito/comigo a anatomia ficou louca./sou todo coração -entrai um todas as partes palpita./oh! Quantas são as primaveras / em vinte anos acesas nesta fornalha!/ uma tal carga acumulada/torna - se simplesmente insuportável. /insuportável não para o verso deveras."/
Poema "Adultos de Vladimir Maiakovski (1893-1930).



domingo, 8 de outubro de 2017

"Homem livre, o oceano é um espelho fulgente /que tu sempre hás-de-amar. No seu dorso agitado,/como em puro cristal, contemplas, retratado, /teu íntimo sentir, teu coração ardente. / gostas de te banhar na tua própria imagem./dás-lhe beijo até, e, às vezes, teus gemidos/nem sentes, ao escutar os gritos doloridos, /as queixas que ele diz em mística linguagem. /vós sois, ambos os dois, discretos tenebrosos; /homem, ninguém sondou teus negros paroxismos, /ó mar, ninguém conhece teus fundos abismos;/os segredos guardais, avaros, receosos! /e há séculos mil, séculos inumeráveis, /que os dois vos combateis numa luta selvagem, /de tal modo gostas numa luta selvagem, /eternos lutadores , ó irmãos implacáveis !
" o homem e o mar " , poema de Charles Baudelaire (1821- 1867 ).
Manhã de sábado, no Japão, em Aquiraz, sorvendo uma caninha no Bar do Louro. Que trabalho pesado !



A alma humana se parece com a água : vem do céu, para o céu sobe, e novamente para baixo à terra precisa ir, mudando eternamente./desce do alto do íngreme rochedo o jato puro, então eleva - se mansamente em ondas de nuvens para a rocha escorregadia, e recebida facilmente, domina veladamente, rumores em silêncio para dentro da profundeza. /escolho erguido contra a queda, espumeja contrariada progressivamente para o abismo./no leito raso arrasta - se para os prados./e no mar sereno contemplam sua face todas as estrelas./ o vento é da onda gentil galanteador; o vento mistura a partir do fundo vagalhões espumantes./ alma da pessoa, como te pareces com a água! Destino da pessoa, como te pareces com o vento!
Canto dos espíritos sobre a água, de autoria de Johann Wolfgang Goethe (1749 - 1832).


SÍNDROME DE DIÓGENES / NOÉ




O mundo assiste ao envelhecimento da população por conta da redução da taxa de natalidade e pelo incremento da longevidade, resultantes dos progressos da medicina moderna. A velhice, condição multidimensional varia de pessoa a pessoa, de acordo com condições socioeconômicas, estilos de vida e presença de morbidades crônicas, tais como, diabetes, obesidade, hipertensão arterial e câncer.

O acúmulo compulsivo de objetos, muitos deles sem qualquer utilidade, denomina-se Síndrome de Diógenes (objetos), ou Síndrome de Noé (animais), nos casos da criação anárquica de animais, evidenciando desleixo e sinais de maus-tratos dos mesmos. Tais alterações psicológicas mostram semelhança com aquelas observadas nos Transtornos Obsessivo- Compulsivos (TOC) ou Transtornos da Acumulação Compulsiva (TAC).

A Síndrome de Diógenes caracteriza-se pela incapacidade do indivíduo para realizar cuidados básicos de higiene pessoal; pela acumulação de objetos velhos sem qualquer função; pelo isolamento social, evidenciando atitudes hostis e total indiferença com o mundo em seu entorno. Para tal, exige-se um diagnóstico diferencial com possíveis quadros de demência, psicose, depressão ou esquizofrenia.

Esta síndrome foi inicialmente descrita em 1966 por Mcmillan e Shaw, como Síndrome de Esqualidez Senil, e, posteriormente, nomeada como Síndrome de Diógenes, em 1975, por Clark e colaboradores.

Isto tudo nos remete à Grécia Antiga, a um movimento – Cinismo - fundado pelo filósofo Antístenes (444 - 365 a. C), nascido em Atenas e discípulo de Sócrates, que procurava imitá-lo de forma exagerada através do culto da pobreza, o desprezo pelos prazeres terrenos, pelas honrarias e pelas riquezas. Pregava-se, então, o regresso à vida solitária e selvagem: nada de civilização, nada de sociedade, nada de pátria. Refutava toda vida refinada. Por essa época surgiu um discípulo de Antístenes, que em pouco tempo tornou-se o nome mais ilustre deste movimento: Diógenes de Sinope (413 – 323 a. C) que resolveu viver à maneira de um cão – Kyon -, daí o termo “ cínico”.

Outros defendem que a palavra cínicos – kynikos- deriva de Kynosarges – cão ágil -, um ginásio dedicado a Hércules e frequentado por Antístenes. O certo é que “ os cínicos” viviam à maneira de cães soltos perambulando pelas ruas e indiferentes às normas sociais estabelecidas. Diógenes vivia num tonel desprovido de outros bens e com uma lâmpada acesa, de dia, “ procurava por um homem”. Era um viver seguindo a natureza, livre de regras, bastando-se -a si- mesmo e não necessitando de nada.

Acredita-se que cerca de 4% da população mundial possa apresentar este transtorno de acumulação compulsiva de objetos descartáveis e uma vigorosa incapacidade de desfazer-se dos mesmos, tornando o ambiente em que vivem, perigosos e insalubres. Deste modo, a Síndrome de Diógenes/ Noé, apresenta-se como um complexo problema geriátrico que demanda decisões clínicas, sociais e éticas, visando minimizar seus danos à saúde desses sofridos indivíduos.



sexta-feira, 6 de outubro de 2017

RUBAIYAT DE OMAR KHAYYAM




“ Que a tua sabedoria não seja uma humilhação para o teu próximo.  Guarda domínio sobre ti mesmo e nunca te abandones à cólera. Se aspiras à paz definitiva, sorri ao Destino que te fere; não firas ninguém”.  Procura ser feliz ainda hoje, pois não sabes o que te reserva o dia de amanhã”.

“ Toma uma urna cheia de vinho, senta-te ao clarão do luar e monologa: - Talvez amanhã a lua me procure em vão”.  Como é vil o coração que, incapaz de amar, não pode conhecer o delírio da paixão!... Se não amas, és indigno do sol que te ilumina, da lua que te consola”.

“Sinto que a minha mocidade refloresce. Desejo aquele vinho que me dá calor e alegria... “ “ Quero vinho... Dizes que é amargo? Não importa. Tem o gosto da vida ”. “ Inútil é que te aflijas: nada podes acerca do teu destino. Se és prudente, aproveita o momento atual. O futuro? Sabes o que ele te reservará? ”.

“ Além da Terra, além do Infinito, eu procurava em vão o Céu e o Inferno. Mas uma voz me disse: O Céu e o Inferno estão em ti mesmo”.

“ Deixemo-nos de palavras vãs. Levanta-te e dá-me um pouco de vinho. Esta noite tua boca é a mais bela rosa do mundo e basta para todos os meus desejos. Dá-me vinho. Que ele seja corado como suas faces, e o meu remorso será leve como as tuas tranças”.

“ Os dias passam rápidos como as águas do rio ou o vento do deserto. Dois há, em particular, que me são indiferentes: o que passou ontem, o que virá amanhã”.

“ Quando nasci? Quando morrerei? Nenhum homem pode evocar o dia de seu nascimento ou prever o de sua morte. Vem, ó minha deliciosa amada! Quero esquecer na embriaguez, a nossa incurável ignorância”.

“ O imenso mundo: um grão de areia perdido no espaço. Toda a ciência dos homens: palavras. Os povos, os animais e as flores dos sete climas: sombras. O resultado de tua meditação: nada”.
“Eu cambaleava de sono, e a Sabedoria me disse: - Nunca, no sono, a rosa da felicidade floriu para ninguém. Por que te abandonares a esse irmão da morte? Bebe vinho! Tens muitos séculos para dormir! ”

“ Ninguém desvendará o que é misterioso. Ninguém poderá ver o que se oculta debaixo das aparências. Todas as nossas moradas são provisórias, salvo a última, no coração da terra. Bebe o vinho amigo! Basta de palavras supérfluas”.

“ Convence-te bem do seguinte: Um dia rua alma abandonará o teu corpo e serás arrastado para trás do véu que flutua entre o universo e o incognoscível. Enquanto esperas, cuida de ser feliz! Não sabes de onde vens. Nem sabe para onde vais”

“ Os sábios e os filósofos mais ilustres caminharam nas trevas da ignorância. E eram os luzeiros do seu tempo!... Em suma, que fizeram eles? Pronunciaram algumas frases confusas e adormeceram fatigados”.

“ Sono sobre a terra. Sono debaixo da terra. Sobre a terra, debaixo da terra, homens deitados. O nada em toda parte. Deserto do nada. Homens chegam. Outros partem”.

“ O bem e o mal disputam a primazia neste mundo. O Céu não é responsável pela felicidade ou desventura que o destino nos reserva. Não agradeças, pois, ao Céu, não o acuses também. Ele é indiferente à tuas alegrias, indiferente aos teus pesares”.

“ Quando eu não viver mais, não haverá rosas, nem ciprestes, nem lábios vermelhos, nem vinhos perfumados. Não haverá mais auroras, nem crepúsculos, nem alegrias, nem penas. O universo não existirá mais, pois tudo existe em função do meu pensamento”.

“ Lâmpadas que se apagam, esperanças que se acendem: Aurora. Lâmpadas que se acendem, esperanças que se apagam: Noite”.

Omar Khayyam (1040-1120), poeta, astrônomo e matemático nasceu na Pérsia. Khayyam, em persa significa, fabricante de tendas, uma atividade exercida pelo pai do poeta. Rubaiyat, plural da palavra persa rubai, que significa quartetos ou quadras. Tal obra recebeu a tradução de grandes literatos como Fitzgerald, Toussaint, M. Bandeira e J. L. Borges. Octávio Tarquínio de Sousa realizou um excelente trabalho de tradução, lançado pela Livraria José Olímpio Editora, onde desabrocha todo o imediatismo e pessimismo do poeta persa, diante do mistério do universo, mostrando que a filosofia e a ciência não vão além das aparências. Na vida, nada de largas esperanças nem de grandes ilusões. O breve momento do hoje pode dar uma ilusão de eternidade. Uma apologia ao Carpe Diem. Omar, utiliza em Rubaiyat, mensagens oriundas do Corão, mas, facilmente, cotejadas, nalguns pontos, com as verdades emanadas no livro sagrado do Eclesiastes, onde “ Tudo é ilusão”: “ O homem é uma sombra, a vida uma bolha de espuma, os rios correm ao mar, e as águas do mar sobem às nuvens, e as nuvens alimentam as fontes, geram os rios, e os rios correm ao mar, e as águas, etc., etc... E a conclusão do Eclesiastes: “Tema a Deus e obedeça aos seus mandamentos porque foi para isso que fomos criados. Nós teremos de prestar contas a Deus de tudo o que fizemos e até daquilo que fizemos em segredo, seja o bem ou o mal” (12.13-14).

Excertos de Rubaiyat de Omar Khayyam, versão portuguesa de Octávio Tarquínio de Sousa; Livraria José Olímpio Editora, décima-terceira edição, 1967.





segunda-feira, 2 de outubro de 2017





Este pensativo pastor de almas,iluminado e iluminador do mundo , no plano metafísico, uma miniatura de Deus , neste final de sábado na embocadura do Rio Pacoti, no Porto das Dunas. " Tudo o que está em harmonia contigo, ó mundo, está em harmonia comigo. Nada do que para ti chega no momento oportuno chega para mim antecipada ou tardiamente; tudo que trazem as tuas estações, é fruto para mim , ó natureza. Tudo vem de ti , tudo tem em ti a sua essência, tudo reflui a ti"

 (Marco Aurélio, imperador romano ).