terça-feira, 26 de setembro de 2023

 O Circo em Fortaleza no Ano de 1960

A passagem de circos mambembes, na segunda metade do século XX , na bucólica e juvenil Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, bulia com toda a gente . Naquele dia , mal o rei - sol se espreguiçara , mostrando o céu da boca em chamas , surgiu do nada , o baque surdo de um tambor nas mãos de colorido palhaço e , junto , um belo casal de bailarinos , ele , esbelto , uma estampa de Rudolf Nureyev caboclo , e ela , uma bela dama de faces coradas , de tirar fôlego de qualquer vivente .
De pronto , se formou uma esteira de moleques para responder aos chamados clássicos:
- E o palhaço , o que é ?
- É ladrão de mulher !
Uma verdadeira pândega : - Arrocha , negrada !
Deste modo , o Circo Garcia fincou praça no areial do campo do América, no bairro da Aldeota . Logo espalhou - se pelos arredores , rumores de que o galã que há pouco percorrera as ruas com o palhaço, não resistia a um rabo de saia . Cabia , portanto , um aviso preventivo no quesito reforço na tranca das portas das casas do bairro.
Sabe - se que seguro morreu de velho !
Numa certa manhã, o areial do campo do América , mostrou - se limpo e sem qualquer sinal do Circo Garcia . Vejamos , em trocados ,
o rescaldo da passagem circense na cidade , sob a ótica da arraia - miúda :
Uma balzaquiana de face corada de rouge comum , com pé fincado no caritó , ingeriu uma prodigiosa porção de querosene jacaré , ao ser rejeitada pelo galã do circo , pondo em risco sua frágil integridade física e mental .
Uma certa dama arisca , de largos atributos corporais , casada de papel e padre , por conta de uns suspiros tolos e falsos desmaios diante do tinhoso artista da ribalta , foi dar com os costados na Assistência Municipal ( SAMDU) , o famigerado " Palácio do Mercúrio- Cromo " , depois de tomar uns corretivos braçais do seu brioso consorte .
E o mais grave , senhores , pasmem : o circo tomou rumo incerto e não sabido , desfalcado de sua fogosa bailarina . Aquela que exibia às claras , dois mimosos poemas no lugar dos fartos seios , que imprimiu fuga levando a tiracolo um pinguço da redondeza , Zezinho Boca de Ouro , de lábia irresistível, e que , pelo visto , iria continuar com cem por cento de aproveitamento, nas suas investidas femininas .
- Que tragédia de Dante , meu Deus !
Uma semana a mais e a gentil Fortaleza iria arder em fogo !
" De um circo eu sou palhaço
No rosto levo este traço
Para alegrar a multidão
Mas é tudo fantasia
É falsa a minha alegria
É tudo , tudo , ilusão.
Ninguém sabe que no meu rosto
A tinta encobre um desgosto
Qu vive a me atormentar
E como a luz da ribalta
Meu coração sente a falta
De quem não me soube amar .
Enquanto a platéia acha graça
Dentro do peito a desgraça
Vem logo me torturar
O riso sempre constante
Faz - me esquecer um instante
Mas volto logo a chorar .
Se todos pudessem ver
A razão do meu sofrer
Não pensavam em gargalhar
E ao terminar a cena
Dariam lenços , por pena
Para o meu pranto enxugar " .
Modinha " Alma de Palhaço " , 1958 , da autoria de Carequinha e Fred Vilar .
O Circo em Fortaleza no Ano de 1960
De pronto , se formou uma esteira de moleques para responder aos chamados clássicos:
- E o palhaço , o que é ?
- É ladrão de mulher !
Uma verdadeira pândega : - Arrocha , negrada !
Deste modo , o Circo Garcia fincou praça no areial do campo do América, no bairro da Aldeota . Logo espalhou - se pelos arredores , rumores de que o galã que há pouco percorrera as ruas com o palhaço, não resistia a um rabo de saia . Cabia , portanto , um aviso preventivo no quesito reforço na tranca das portas das casas do bairro.
Sabe - se que seguro morreu de velho !
Numa certa manhã, o areial do campo do América , mostrou - se limpo e sem qualquer sinal do Circo Garcia . Vejamos , em trocados ,
o rescaldo da passagem circense na cidade , sob a ótica da arraia - miúda :
Uma balzaquiana de face corada de rouge comum , com pé fincado no caritó , ingeriu uma prodigiosa porção de querosene jacaré , ao ser rejeitada pelo galã do circo , pondo em risco sua frágil integridade física e mental .
Uma certa dama arisca , de largos atributos corporais , casada de papel e padre , por conta de uns suspiros tolos e falsos desmaios diante do tinhoso artista da ribalta , foi dar com os costados na Assistência Municipal ( SAMDU) , o famigerado " Palácio do Mercúrio- Cromo " , depois de tomar uns corretivos braçais do seu brioso consorte .
E o mais grave , senhores , pasmem : o circo tomou rumo incerto e não sabido , desfalcado de sua fogosa bailarina . Aquela que exibia às claras , dois mimosos poemas no lugar dos fartos seios , que imprimiu fuga levando a tiracolo um pinguço da redondeza , Zezinho Boca de Ouro , de lábia irresistível, e que , pelo visto , iria continuar com cem por cento de aproveitamento, nas suas investidas femininas .
- Que tragédia de Dante , meu Deus !
Uma semana a mais e a gentil Fortaleza iria arder em fogo !
" De um circo eu sou palhaço
No rosto levo este traço
Para alegrar a multidão
Mas é tudo fantasia
É falsa a minha alegria
É tudo , tudo , ilusão.
Ninguém sabe que no meu rosto
A tinta encobre um desgosto
Qu vive a me atormentar
E como a luz da ribalta
Meu coração sente a falta
De quem não me soube amar .
Enquanto a platéia acha graça
Dentro do peito a desgraça
Vem logo me torturar
O riso sempre constante
Faz - me esquecer um instante
Mas volto logo a chorar .
Se todos pudessem ver
A razão do meu sofrer
Não pensavam em gargalhar
E ao terminar a cena
Dariam lenços , por pena
Para o meu pranto enxugar " .
Modinha " Alma de Palhaço " , 1958 , da autoria de Carequinha e Fred Vilar .
Pode ser um doodle de clarinete, trompete e saxofone
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Céo Filgueiras de Menezes
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 Sobre a Brevidade da Vida - Sêneca

A maior parte dos mortais , lamenta a maldade da natureza , porque já nascem com a perspectiva de uma curta existência, e porque os anos que lhes são dados transcorrem rápida e velozmente . Hipócrates, o pai da Medicina , afirmava que " A vida é breve , a arte , longa " . Não temos exatamente uma vida curta , mas desperdiçamos uma grande parte dela . A vida , se bem empregada , é suficientemente longa , e nos foi dada com muita generosidade para a realização de importantes tarefas . Não somos privados , mas pródigos de vida . Se souberes viver a vida , ela é longa . Mas a insaciável ganância domina um ; outro , desperdiça sua energia em trabalhos supérfluos ; um encharca - se de vinho , outro fica entorpecido pela inércia ; um está sempre preocupado com a opinião alheia , outro por um irreprimido desejo de comerciar , é levado a explorar terras e mares na esperança de obter lucros .
Pequena é a parte da vida que vivemos , pois todo o resto não é vida , mas somente tempo . Nenhum homem sábio deixará de se espantar com a cegueira do espírito humano . Vive como se fosse viver para sempre , nunca reconhecendo sua fragilidade . Que tolice dos mortais a de adiar para os cinquenta ou sessenta anos , as sábias decisões e , a partir daí, onde poucos chegaram , mostrar desejo de começar a viver ?
Deve - se aprender a viver por toda a vida e , por mais que te admires , durante toda a vida se deve aprender a morrer . Não julgues que alguém viveu muito por causa de suas rugas e cabelos brancos : ele não viveu muito, apenas existiu por muito tempo .
A vida se divide em três períodos : aquilo que foi , o que é , e o que será . O que fazemos é breve , o que faremos , dúbio , o que fizemos , certo . Algo se perde no passado ? Ele recupera com a memória. Está no agora ? Ele desfruta . Há de vir com o futuro ? Ele antecede . A união de todos os tempos em um só momento faz com que sua vida seja longa .
Lúcio Anneo Sêneca : filósofo , dramaturgo , político e escritor romano ( 4 a.C - 65 d.C . )
" Por acaso, surpreendo - me no espelho : quem é esse
Que me olha e é tão mais velho que eu ?
Porém, seu rosto... é cada vez menos estranho
Meu Deus , meu Deus ... Parece
Meu velho pai - que já morreu !
Como pude ficar assim ?
Nosso olhar - duro - interroga :
- O que fizeste de mim ?
- Eu , pai ? Tu é que me invadiste,
Lentamente , ruga a ruga ... que importa ?
Eu sou , ainda , aquele menino teimoso de sempre
E os teus planos enfim lá se foram por terra .
Mas sei que vi , um dia - a longa , a inútil guerra
Vi sorrir , nesses cansados olhos , um orgulho triste ..."
O Velho no Espelho , da autoria de Mário Quintana ( 1906 - 1994 ) .
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domingo, 24 de setembro de 2023

 Meu Amor Ficou no Hotel - Caio Cid

Para Terezinha Miranda Cordeiro
" Ninguém pense que viajei sozinho de Fortaleza para o Rio , que vim de lá solteiro, livre sem responsabilidade . Trouxe comigo uma delicada companheira, uma criatura que não se conformou em me ver sair abandonado ,como um sujeito sem amor e sem merecimento .
Durante a longa travessia aérea, minha doce amiga não se manifestou , não exigiu nada , não revelou o menor aborrecimento . Quietinha em seu lugar , ligada ao meu destino de sua espontânea vontade , mantendo - se firme no avião, corajosa e bem disposta . Nunca me disse uma só palavra de arrependimento, nunca me deu o menor sinal de receio .
Quando o " Capitanea " posou serenamente na Ponta do Calabouço " , desci meio tonto , apanhei um táxi, levando comigo a destemida e delicada jovem , cuja atitude ainda era a mesma que mantivera em toda a viagem .
Já no quarto que me fora reservado no Hotel Mem de Sá - uma verdadeira armadilha à bolsa dos adventícios - abri a malota, banhei o rosto , fiz que estava a vontade e dirigi a palavra áquela que não trepidara em acompanhar - me :
- Bem , minha filha , agora fique no hotel para repousar um pouco , enquanto vou fazer o meu primeiro contato com a cidade misteriosa . Não se impressione . Tome conta da cama e durma um sono , se puder . Voltarei dentro de uma hora e meia .
Na Galeria Cruzeiro , ainda com o ronco dos motores na cabeça , fui abraçando os primeiros conterrâneos. Cada um se mostrava mais espantado com a minha presença , como se eu tivesse sido condenado a vinte anos de Fernando de Noronha e de repente surgisse no Rio de Janeiro .
Mas a maior sensação que produzi no seio da turma foi quando declarei que havia trazido uma cearense comigo , uma belezinha do norte , uma franzina e ingênua filha da terra de Iracema .Todos ficaram logo muito esquentados e dois ou três dos malandros pediam com insistência , que eu os levasse imediatamente ao hotel , pois faziam muito empenho em conhecer de perto a minha pequena . Embora contrariados, tiveram que ceder às minhas razões e eu fui embora depressa para o hotel .
Encontrei - a passeando sobre a colcha da cama , sempre calma , sempre dócil, como se fosse minha escrava , sem direitos a reclamar .
Acariciei - a com a ponta do dedo .
Arranjei uma caixinha de sabonete , furei o papelão em várias partes, para garantir - lhe a entrada de ar , e pus lá dentro , um torrão de açúcar, ao lado de um pedacinho de laranja .
Infelizmente , no quarto dia tive de lamentar a morte da minha querida companheira . Ao abrir a caixa para renovar o alimento, meus olhos caíram sobre o pequeno cadáver. Cavei um branquinho na parede e ali sepultou a inditosa formiga - de - roça , a imprudente cearense que viera clandestinamente no fundo de minha malota de viagem .
Nunca mais a esquecerei . Tenho impressão que fiquei viúvo ! " .
Crônica poética da autoria de Caio Cid ( 1904 - 1972 ) , nascido na Serra de Aratanha , município de Pacatuba , Ceará . Filho de Raimundo Pereira Cavalcante , e de Agripina Soares Cavalcante . Cronista , contista , poeta e , genuinamente , boêmio . Vivia cercado de intelectuais, artistas e notívagos da cidade , como Demócrito Rocha , Otacilio de Azevedo , Otávio Lobo e Leonardo Mota .
Conheci - o em minha infância , na rua Rodrigues Júnior , na boca da noite , com um jornal debaixo do braço , e em busca de novas histórias da vida .
Publicou : Aleuda ( 1934 ) ; Aguapés ( 1935 ) ;
Gitirana ( 1938 ) ; Canapum ( 1950 ) .
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sexta-feira, 22 de setembro de 2023

 A Tarde Chegou

Todo ser senciente deveria olhar para quatro direções durante seu breve périplo terreal :
Em frente , para saber onde se dirige . Para trás, para lembrar de onde vem . Para baixo , para não pisar em ninguém . Para os lados , para ver quem o acompanha em tempos difíceis .
" A tarde chegou .
Terceira idade !
Que fase maravilhosa !
Aqui não tem velho ,
Só que chegou a tarde .
Uma tarde cheia de experiência.
Experiência para dar conselhos .
Não há velhos aqui ,
Só chegou a tarde .
Velho é o Mar que cresce
Velho é o Sol e nos aquece .
Velha é a Lua e nos ilumina ,
Velha é a Terra e nos dá vida ,
Velho é o Amor e nos encoraja .
Aqui não tem velhos , só chega a tarde .
Somos seres plenos de conhecimento , formados pela escola da vida e
Pelo tempo que nos proporcionou a pós - graduação.
Subimos na árvore da vida , cortamos
Os seus frutos .
São estes frutos , nossos filhos ,
Que cuidamos com paciência , e
Nos reverte esta paciência em amor .
Foram filhos , são homens , serão velhos .
A manhã virá e chegará a tarde .
E eles também darão conselhos .
Aqui não há velhos .
Só que chegou a tarde .
Jovem , se em teus caminhos encontrar
Seres de andar pausado , de olhares serenos e amorosos , cabelos prateados , de pele enrugada , mãos trêmulas,
Não os ignores , ajuda - os .
Brindeis teus novos amigos com carinho .
Toma em conta que um dia , também a ti ,
Chegará a tarde ."
Poema " Llegó la Tarde " da autoria de Leda Fuertes de Casanova , em tradução livre . Nascida na Nicarágua , onde exerceu o magistério e escreveu poesia .
Foto que ilustra o texto : um fim de tarde no Porto das Dunas, no Litoral Leste do Ceará.
Pode ser uma imagem de natureza, crepúsculo, horizonte e oceano
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