quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Um Paracelso moderno

Oficialmente, aquele homem exageradamente alto e espirituoso ,não pertencia aos quadros de médicos do Hospital Geral do  Exército de Fortaleza . Ele prestava assistência a mulheres de militares da 
Marinha do Brasil, aqui residentes. Travei contato com tal figura, pois fazia eu parte do elenco de servidores civis do Ministério do Exército, como médico ginecologista e obstetra . Passei a auxiliar algumas de suas cirurgias e fazia as rondas com o mesmo nas enfermarias do dito hospital.

O elegante Hospital Geral do Exército de Fortaleza , que  visto do alto , adquire o formato de uma aeronave  , naquela época , pós – movimento militar de 64 , na juvenil e fértil imaginação dos noveis tenentes–médicos , irradiava um misto de real bonança e incômoda rigidez . Por um lado ,um ameno ambiente para acolher gente com agravos a saúde e por outro , para guardar sob custódia elementos que o regime militar julgava perniciosos aos interesses da revolução . Por ali circulavam ,também ,figuras enigmáticas , a paisana , que os detetives filhos de Hipócrates , logo descobriram pertencer aos quadros da Policia Federal e do famigerado e nada simpático SNI ( Serviço Nacional de Informação ) .
 Aos poucos ,fui desvendando mistérios  daquele gentil-homem : raramente cobrava seus honorários médicos  e quando agraciado com mimos , distribuía-os com  quem estivesse a sua volta . Em várias oportunidades flagrei-o entregando dinheiro a  humildes  funcionários . Certa feita , quis me presentear com quatro pneus novos que recebera de uma cliente . Foi duro lhe mostrar que eu não necessitava  daquilo ,  pois meu Fusca ,  de tala larga ,  parecia perfeito . Observando o veículo do amigo ,uma curtida  Brasília , percebi que os pneus da mesma mostravam- se  em condições  de miséria .
Durante uma conversa a sós , o tal esculápio , mandou-me um petardo , uma certeira  cruzada de direita : alertou-me sobre “ a aura “ positiva/ negativa ;  brilhante / opaca , para ele  fácil de perceber presente  nas pessoas . Era olhar e ver o etéreo invólucro sem necessitar de qualquer aparato tecnológico. Eu nunca pensara  a sério sobre tal assunto   . A medicina alopática e  ortodoxa que me fora  incutida , não permitia tais veleidades .  Na ocasião detalhou-me uma lista de profissionais de nossa convivência com a dita  classificação . Que surpresa ! .  Para mim  , até então ,  todo mundo era  perfeito  , salvo raras exceções .  O  pior ,  ficou por conta que eu andava , por essa época ,  esmiuçando nos sebos da cidade ,  obras de enigmáticas figuras ,  verdadeiros magos , tais como , Pitágoras , Platão , Plotino  e  Paracelso . Este  último , com o apodo de“ Lutero da medicina “ destronava Galeno e exigia um novo olhar para a medicina não convencional  . Tudo veio a calhar para um jovem médico, também excêntrico , introvertido e inconformista  de pouco mais de vinte  anos .
Andava eu num tranquilo plantão do dito  hospital , quando fui chamado para atender a  uma puérpera com febre e convulsão numa enfermaria . Tratava-se de uma paciente que o mago/ doutor havia operado pela manhã.  No prontuário não constava  anotação sobre qualquer tipo de anormalidade  . Pensei logo  tratar – se de  um caso de  eclampsia . Prescrevi um anticonvulsivante -  fenitoína  -  associado a um  antitérmico -  dipirona -   ,  dando a seguir o caso por  encerrado .  Pouco tempo depois fui alertado pela enfermagem que o quadro da paciente sofrera   agravo  .  Incontinenti  , liguei para o médico que a operara . Ele calmamente me falou que já esperava por tal  intercorrência . Como  assim ? . Ao  chegar à enfermaria ,   plantei – me  ao lado dele no aludido atendimento  . O médico , circunspecto , nada  perguntou  , apenas  colocou , suavemente , a mão sobre a fronte da paciente que convulsionava . Os espasmos logo se  esvaíram , fugindo súbito do corpo . Seguiu- se  um relaxante  sono da cliente  .    No mesmo instante a mão  , o braço e a face , num só ritmo ,  do dito esculápio deram então  início a um tremor convulsivo , renitente . Caiu – me o  queixo ! .  Minutos depois ,tudo voltou ao normal com a puérpera e com o médico , sãos e indiferentes a tudo  . Perguntei em seguida ao doutor o que acontecera e ele estranhou minha interrogação .  Não vira nada , coisa anormal nenhuma se passara ,  a não ser um alarme falso disparado por um doutorzinho medroso e pouco crente nas formas não convencionais de cura em medicina . Hoje, aquele bendito mago que cruzou meu caminho, transita em outra esfera , numa dimensão qualquer ,  posto que , devolveu seu invólucro corporal  à  terra , do mesmo jeito que o recebeu , pobre e nu   . Propagam  alguns , não sem razão ,  que ele ainda faz rondas por aí ajudando criaturas de Deus , pelo  mundo afora .


                                                                            

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