quinta-feira, 7 de março de 2019

O Samba do Crioulo Doido

Sérgio Marcus Rangel Porto ( 1923 - 1968 ) , ou simplesmente Sérgio Porto , ou ainda , Stanislaw Ponte Preta era mestre na arte de analisar o lado picaresco da nossa História. Viveu , ombro a ombro, com gigantes da palavra , como , Álvaro Moreira , Jorge Amado , Fernando Sabino, Rubem Braga e Aparício To relly, o impagável Barão de Itararé. Criou tipos antológicos como Tia Zulmira , primo Altamirando e Rosamundo.
Stanislaw define - se assim num auto - retrato :
" Jornalista , radialista , teatrólogo ora em recesso, humorista , publicista e bancário. Além disso: marido , pescador, colecionador de disco, ex - atleta e , hoje , cardíaco.
Principais motivações: mulher.
Paradoxos : boêmio que adora ficar em casa , irreverente que revê o que escreve, humorista a sério.
Ódios inconfessos : puxa - saco , militar metido a machão, burro metido a sabido e , principalmente, racista.
Panaceias caseiras : quando dói do umbigo para baixo : elixir paregórico; e do umbigo para cima , aspirina.
Tentações irresistíveis: passear na chuva , rir em horas impróprias e dizer ao ouvido de uma mulher besta que ela não é tão boa como pensa ."
O "Samba do Crioulo Doido " , de sua autoria , faz uma mordaz crítica ao Departamento de Turismo do Rio de Janeiro, que obrigava as escolas de samba apresentarem, sempre, um samba - enredo , inspirado em fato histórico brasileiro. Em 1968, um certo sambista recebeu a incumbência de escrever uma música abordando "A atual conjuntura do país ". Foi o suficiente para o crioulo enlouquecer e construir um autêntico pastiche ou disparate :
"Foi em Diamantina/onde nasceu JK/que a Princesa Leopoldina/arresolveu se casar/mas Chica da Silva/tinha outros pretendentes/e obrigou a Princesa/a se casar com Tiradentes/lá aí lá aí lá aí lá/o bode que deu vou te contar/Joaquim José que também é/da Silva Xavier/queria ser dono do mundo/e se elegeu Pedro II/das estradas de Minas/seguiu pra São Paulo/e falou pra Anchieta/ o vigário dos índios/aliou - se a D. Pedro /e acabou com falseta/da união deles dois/ficou resolvida a questão/e foi proclamada a escravidão/assim se conta essa história/que é dos dois a maior glória/Dona Leopoldina virou trem / e D. Pedro é uma estação também/ô, ô, ô, ô, o trem tá atrasado ou já passou "
E assim segue o trem da ilusão carnavalesca, com as famigeradas escolas de samba contando até os dias atuais, nossa História, às vezes, de forma arrevesada.
Bode Ioiô, foi um herói cearense cabeça- chata , do início do século passado , que chegou a Fortaleza fugindo da famosa seca de 15 , bem retratada pela grande dama Rachel de Queiroz. O resistente retirante vivia solto pela cidade e tornou - se um folgado boêmio chegado até a uma santa aguardente . Virou bode - celebridade convivendo com políticos, artistas e com o povo em geral. Acredita - se que o epíteto Ioiô tenha surgido pelo fato do bicho subir e descer , diariamente da Praia de Iracema até a Praça do Ferreira.
Bode Ioiô, à época, recebeu uma boa votação para vereador de Fortaleza. Nunca chegou a assumir legalmente , mas manteve a picardia do cetro até o fim de seus luminosos dias.
Em 1931 , o Bode Ioiô morreu , provavelmente de velhice , talvez de cirrose hepática por conta de avarias causadas pelas bicadas de cana. A turma da teoria da conspiração sugere até um atentado político.
O ilustre retirante foi embalsamado , às custas da empresa que o adotara em vida , a Rossbach Brazil Company, e hoje é reverenciado no Museu do Ceará como um digno filho da Terra da Luz .
Viva o Bode Ioiô !

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