quarta-feira, 29 de novembro de 2017



UMA TÁBUA DE SALVAÇÃO
Para o Dr. Eduardo Augusto Almeida Prado




“A vida é o dia de hoje/a vida é um ai que mal soa/a vida é sombra que foge/a vida é nuvem que voa/a vida é sonho tão leve/que se desfaz como a neve/e como o fumo se esvai/a vida dura um momento/mais leve que o pensamento/a vida leva-a o vento/a vida é flor na corrente/a vida é sopro suave/a vida é estrela cadente/voa mais leve que a ave/nuvem que o vento nos ares/onda que o vento nos mares/uma após outra lançou/a vida- pena caída/da asa de ave ferida-/de vale em vale impelida/a vida o vento a levou”
Poema de autoria de João de Deus Ramos (1830- 1895) nascido em Algarve, Portugal.
Um octogenário ateu, boêmio e “rapaz velho” sentindo chegar a sua hora de encarar a velha Parca, em seu casebre no Arraial Moura Brasil, ali próximo à Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza, pediu socorro a um esculápio, antigo companheiro nas libações de Baco e de Vênus.
“– Doutor, quando eu fechar os olhos para este mundo, o que me aguarda do outro lado, se é que existe este outro lado? E não me venha passar um sermão, por favor!”
O filho de Hipócrates, agnóstico, não podia deixar o amigo na chuva, mesmo que às custas de sofismas.
“- Meu companheiro, para oitenta-janeiros bem vividos, a safra foi razoável, compartilhamos, quase que integralmente, com nossos irmãos de estrada terreal as Sete Virtudes Capitais: humildade, caridade, paciência, diligência, generosidade, temperança e castidade. Compreender o universo, diz Spinoza é estar libertado dele. Compreender tudo, é estar livre de tudo. Somos escravos de tudo o que ignoramos- somos livres de tudo o que sabemos. Confie em mim. A eternidade que lhe aguarda vai ser uma festa gozosa junto a amigos e amigas, longe da irascível ampulheta do tempo, entendeu?”
“-Entendi e vou fazer força para acreditar, mas me explique porque nunca ninguém me alertou para isso antes? E o que vai ser de mim sem a companhia das morenas fogosas do Passeio Público, da Praça da Estação , da Praça dos Leões e do Curral?
O velho boêmio puxando profundamente o ar, cerrou os olhos, mansamente, com um leve sorriso nos lábios, segurando a mão firme do doutor, ambos sem resposta pronta e definitiva para o grande mistério do além!
“Deixo os versos que escrevi/as cantigas que cantei/cinco ou seis coisas que eu sei/e um milhão que esqueci/deixo este mundo daqui/selva com lei de cassino/vou renascer num menino/num país além do mar... / licença, que eu vou rodar/no carrossel do destino/enquanto eu puder viver/tudo o que o coração sente/o mundo estará presente/ passando sem resistir/na hora que eu for partir/para as nuvens do divino/que a viola seja o sino/tocando pra me guiar/licença, que eu vou rodar/no carrossel do destino/ romances e epopeias/me pedindo pra brotar/e eu tangendo devagar/a boiada das ideias/sempre em busca das colmeias/onde brota o mel mais fino/e um só verso, pequenino/mas que mereça ficar/licença, que eu vou rodar no carrossel do destino”
Carrossel do Destino, composição de Antônio Nóbrega e Bráulio Tavares.

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