domingo, 10 de março de 2024

 O Crepúsculo de uma Vida

Um octogenário ateu , boêmio e " rapaz velho " , sentindo chegar a sua hora de encarar a rígida Parca , em seu modesto lar no Arraial Moura Brasil , ali próximo à Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza , pediu socorro a um esculápio, antigo companheiro nas libações de Baco e de Vênus .
" - Meu doutor e amigo , quando eu fechar os olhos para este vasto mundo , o que me aguarda do outro lado deste profundo e escuro mistério? E não me venha passar um sermão , por favor ! "
O esculápio e boêmio , não podia deixar o amigo na chuva , num grave momento daqueles, mesmo que as custas de sofismas .
" - Companheiro , para seus oitenta - janeiros bem vividos , a safra foi bem razoável , onde compartilhamos com nossos irmãos de estrada terreal , virtudes , como : humildade , caridade , paciência, diligência , generosidade e temperança . Compreender o universo , segundo Spinoza , é estar livre dele . Compreender tudo é estar livre de tudo . Somos escravos de tudo que ignoramos , e livres de tudo o que sabemos . Confie em mim . A eternidade que lhe aguarda vai ser uma festa gozosa, longe da irascível ampulheta do tempo " .
" - Entendi , e vou fazer força para acreditar . E o que vai ser de mim , pobre coitado , sem a companhia das morenas fogosas do Passeio Público, da Praça da Estação , da Praça dos Leões, e do Morro do Ouro ? "
O velho boêmio, puxando profundamente o ar , cerrou os olhos , mansamente , com um leve sorriso nos lábios, segurando a mão firme do doutor , ambos sem resposta pronta e definitiva para o grande mistério do além !
Será simples assim ? , não deixar o tempo fugir por entre os dedos , e saborear , com sofreguidão, o néctar da vida , posto que , amanhã a lua poderá em vão nos procurar .
" Deixo os versos que escrevi / as cantigas que cantei/ cinco ou seis coisas que eu sei / e um milhão que esqueci / deixo este mundo daqui/
selva com lei de cassino/ vou renascer num menino/ num país além do mar .../ licença que eu vou rodar/ no carrossel do destino/ enquanto eu puder viver/ tudo que o coração sente/ o mundo estará presente/ passando sem resistir/ na hora que eu for partir/ para as nuvens do divino/ que a viola seja o sino/ tocando pra me guiar/ licença que eu vou rodar/ no carrossel do destino / romances e epopeias/ me pedindo pra brotar/ e eu tangendo devagar/ a boiada das ideias/ sempre em busca das colmeias/ onde brota o mel mais fino / e um só verso pequenino/ mas que mereça ficar/ licença, que eu rodar no carrossel do destino " .
Composição musical de Antônio Nóbrega, e , Bráulio Tavares .
Foto que ilustra o texto , o por do sol na Praia do Mucuripe, em Fortaleza .
Pode ser uma imagem de crepúsculo, praia, horizonte, nuvem e oceano
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Martinho Rodrigues, Lizanne Santiago e outras 9 pessoas

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