quarta-feira, 19 de setembro de 2018


SOBRE POMBAS, BOMBAS E SAPOS

“ Enfunando os papos / saem da penumbra /aos pulos, os sapos /a luz os deslumbra/ em ronco que aterra/ berra o sapo-boi :/ -“ meu pai foi à guerra! / - “ não foi “- “ foi” – não foi “ /o sapo- tanoeiro / parnasiano aguado/ diz: - “ meu cancioneiro é bem martelado “/vede como primo/ em comer os hiatos /que arte! E nunca primo em comer os hiatos! /que arte! E nunca rimo/ os termos cognatos/ meu verso é bom/ frumento sem joio/ faço rimas com / consoantes de apoio/ vai por cinquenta anos/ que lhes dei a norma: /reduzi sem danos/ a fôrmas a forma/clame a saparia/ em críticas céticas:/ - “não há mais poesia / mas há artes poéticas...”/urra o sapo- boi :/ - “ meu pai foi rei “- “ foi” – “ não foi “- “ foi” – “ não foi “/brada em assomo o sapo-tanoeiro :- “ a grande arte é como / lavor de joalheiro /ou bem de estuário/ tudo quanto é belo/ tudo quanto é vário/ canta no martelo” /outros sapo- pipas ( um mal em si cabe )/ falam pelas tripas: - “ sei “ – “ não sabe “ – “ sabe “ /longe desta grita / lá onde mais densa/ a noite infinita/ verte a sombra imensa/ lá, fugido ao mundo , sem glória , sem fé/ no perau profundo/ e solitário, é que soluças tu/transido de frio / sapo cururu/da beira do rio “/

Poema “ Os Sapos” de Manuel Bandeira (1886 – 1968), escrito em 1918 e publicado no ano seguinte. Foi declamado por Ronald de Carvalho durante a Semana de Arte Moderna de 1922.

“ Pra se poder viver/ compra-se o mundo em que se vive /como quem compra um objeto/ secreto, mas visível /compram- se os seus problemas/ sem solução/ quem nasce no mundo, hoje/compra, sem o querer/uma pomba / com um alfinete feérico na cabeça /uma pomba extremamente vizinha  de bomba /uma e outra têm asas/ uma e outra são limpas/ ambas são irmãs pelo som/ um simples equívoco/ de fonemas ou de telefonemas/ entre os dois hemisférios / uma troca de b por p/ e o mundo explodirá/ em nossa mão (p) bomba /

Poema “ Flechas contra o muro “ de Cassiano Ricardo (1895 – 1975).
Ambos os poemas, de Manuel Bandeira e de Cassiano Ricardo, metafóricos e atemporais, o primeiro como uma crítica aos exageros verbais do Parnasianismo e o segundo sobre o perigo da polarização do mundo atômico com seus cogumelos da morte. A alegoria se presta, também, para o delicado momento que vivemos, onde pombas, bombas, facões e sapos, rondam nossas cabeças, ameaçadoras, em desvario, num país dividido, incitado ao ódio por um bolo de falsos líderes e atolado numa duradoura crise ética, política e social, ao sabor de um mar encapelado pronto para engolir esta frágil nau sem rumo, ao deus-dará. Em outubro vindouro utilizando uma poderosa arma, um voto consciente, podemos acabar de vez com a corrupção. 

 Agora ou vai ou racha!







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