segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Viver Simplesmente
"Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós- próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex - votos aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer - te. A resposta
Está além dos deuses."
" Viver Simplesmente " da autoria do vate português Fernando Pessoa ( 1888 - 1935 ).
Num fim de tarde de domingo na Praça Rogério Fróes, em Fortaleza , pastoreando no céu um mimoso "rebanho de ovelhas " para um merecido repouso. Amém!

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Fortaleza Menina - Moça
Praça Arquiteto Rogério Fróes , inaugurada em 11 de novembro de 1974 , no Bairro de Dionísio Torres, em Fortaleza. No momento passando por uma bela reforma para regozijo dos amantes da eterna musa cearense.
"Que coisas direi de ti, Fortaleza, se tantos já te cantaram em prosa e verso, e abriram o coração aos teus encantos, e louvaram com amor a tua face e te disseram tantos madrigais ?
Teu claro rosto e graça delicada inspiraram a formação de versos e serestas , e ficaste nas almas como uma valsa, iluminando mudas benquerenças. Ninguém jamais deixou de amar. Teu lirismo te segue como uma sombra. És bela e te embalas com as canções que chegam de teu mar. E nunca te apartaste dos mistérios que formam tua alma....
Ó cidade de ruas tão " alinhadas como os versos de um soneto !" Quem hoje vê tuas praças policrômicas, arranha - céus soberbos aviões cruzando o espaço, cinemas, parque de indústria, bairros florescentes e estações de rádio que enviam para longe tua voz ardente, nem pensará em teu itinerário lírico, em tua infância gentil, em tua aurora, nos claros tempos de teu amanhecer!...
Penso em ti, Fortaleza, em tuas cirandas e brincadeiras inocentes - a prenda , o anel, o santo, a cabra - cega - quando todos saiam à noite para as praças, ao encontro do luar...
Tudo isso, Cidade, imprimiu em tua alma esse sentido lírico que nunca te abandona, que te põe sempre romântica diante de nossos olhos. E foram muitos poetas que cantaram em teu louvor , compondo verdadeiros madrigais , exalçando tua graça de mulher em versos transbordantes de ternura.
Vem de muito longe o nosso amor por ti "
" Cancioneiro da Cidade de Fortaleza ", obra organizada pelo Príncipe dos Poetas Cearenses , Artur Eduardo Benevides ( 1923 - 2014 ), Edições Clã , 1953.

segunda-feira, 25 de novembro de 2019



Vossa Excelência
Um famoso antropólogo, escritor e político mineiro foi contemplado com a admissão para a vetusta Academia Brasileira de Letras, a Casa de Machado de Assis , o querido Bruxo do Cosme Velho. No aguardado dia de sua posse naquele silogeu, o novo confrade , engalanado com vistosa indumentária dos imortais , acenou para um táxi.
Um motorista grisalho , com um riso aberto de poucos dentes , exclamou :
" - Vossa Majestade quer se dirigir para qual palácio?"
" - Olhe o respeito , meu velho !" , esbravejou a pomposa autoridade.
" - Desculpe , Majestade", retorquiu o humilde taxista .
" - Com toda esta pompa , imaginei tratar - se de um Rei ou de um Imperador ! "
Hoje em Pindorama , onze senhores de pesados trajes negros determinaram que só podem ser nominados pelos cidadãos comuns por "Vossa Excelência " , sob pena de arcar com prisão aqueles que ferirem tal norma.
Ah , Vaidade das vaidades !
Não sabem estes arrogantes senhores que todos somos filhos da terra , dela retiramos nosso sustento e no fim , nela dormiremos até o despertar de um novo tempo !
" Não fala com pobre , não dá mão a preto
Não carrega embrulho
Pra que tanta pose , doutor
Pra que esse orgulho.
A bruxa que é cega esbarra na gente
E a vida estanca
O enfarte lhe pega , doutor
E acaba essa banca.
A vaidade é assim, põe o bobo no alto
E retira a escada
Mas fica por perto esperando sentada
Mais cedo ou mais tarde ele acaba no chão
Mais alto o coqueiro, maior é o tombo do coco afinal
Todo mundo é igual quando a vida termina
Com a terra em cima e na horizontal "
Composição musical " A Banca Do Distinto " , da autoria do paraense Billy Blanco (1924 - 2011).

sábado, 16 de novembro de 2019



O Poeta/Médico Laurindo Rabelo

"O que fazes, ó minha alma !/coração porque te agitas?/coração, porque palpitas?/porque palpitas em vão ?/se aquele que tanto adoras/te despreza, como ingrato, /coração, sê mais sensato,/busca outro coração!/
Corre o ribeiro suave/pela terra brandamente/se o plano condescendente/ dele se deixa regar;/mas , se encontra algum tropeço/que o leve curso lhe prive,/busca logo outro declive,/vai correr noutro lugar.
Segue o exemplo das águas;/coração, porque te agitas?/coração, porque palpitas?/porque palpitas em vão?/se aquele que tanto adoras/ te despreza, como ingrato,/coração, sê mais sensato,/busca outro coração!/
Nasce a planta, a planta cresce,/vai contente vegetando,/só por onde vai achando/terra própria a seu viver;/mas , se acaso a terra estéril/ as raizes lhe é veneno ,/ela vai noutro terreno/ as raízes esconder.
Segue o exemplo da planta;/coração, porque te agitas?/coração, porque palpitas?/porque palpitas em vão?/se aquele que tanto adoras/te despreza, como ingrato/coração, sê mais sensato,/busca outro coração!
Saiba a ingrata que punir/também sei tamanho agravo/se me trata como escravo,/mostrarei que sou senhor;/como as águas, como a planta,/fugirei dessa homicida;/quero dar a um'alma fida/ minha vida e meu amor "
Poema " A Minha Resolução " , da autoria de Laurindo Rabelo.
Laurindo José da Silva Rabelo ( 1826 - 1864 ), nasceu e morreu no Rio de Janeiro. De origem humilde , mestiço, teve uma vida prenhe de sacrifícios. Cursou o Seminário São José e a Escola Militar . Ingressou , posteriormente na Faculdade de Medicina no Rio de Janeiro e graduou - se na Bahia. Casou - se com a Sra. Adelaide Luiza Cordeiro e não deixou descendentes.Faleceu aos 38 anos de idade em decorrência de uma doença cardíaca.
Foi um médico, professor , boêmio e poeta popular , de cunho amargo e pessimista. Pertenceu à Academia Brasileira de Letras , Cadeira 26.

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Saudades de Capistrano de Abreu

João Capistrano de Abreu, historiador e geógrafo brasileiro, nasceu a 23 de outubro de 1853, no município de Maranguape, no Ceará, e faleceu a 13 de agosto de 1927, no Rio de Janeiro. Filho primogênito do casal Jerônimo Honório de Abreu e Antônia Vieira de Abreu.
Cumpriu seus estudos em Fortaleza e Recife , e depois migrou para o Rio de Janeiro, onde triunfou com galhardia num rigoroso concurso para lente do tradicional Colégio Pedro II, na disciplina de História, no ano de 1883.
Bem moço ainda , dotado de notável inteligência e inveterado estudioso, logo despontou nos estudos da Historiografia , Corografia e Etnografia. Foi , com efeito, o maior historiador brasileiro, intérprete arguto e crítico penetrante dos fatos de nossa formação histórica. Na sua opulenta bibliografia cabe destacar :
O Descobrimento do Brasil (1929 ),
Capítulos da História Colonial ( 1934 ),
Caminhos Antigos e Povoamento do Brasil ( 1930 ),
Ensaios e Estudos ( 1931 ),
Correspondências ( 1938 ).
Capistrano de Abreu , uma vez convidado para fazer parte da Academia Brasileira de Letras, declarou, escusando - se, que a única sociedade de que fazia parte era o gênero humano, e isso mesmo porque não podia demitir - se. Os livros que deixou constituíram para ele , simples notas de uso pessoal, de que , pode - se dizer , os amigos se apossaram . Ele, por sua vontade, os teria destruído a todos, para que não ficasse na terra vestígio algum de sua passagem .
" Eu proporia que se substituíssem todos os capítulos da Constituição por : - Artigo Único: todo brasileiro fica obrigado a ter vergonha na cara !" , vaticinou certa feita o nobre cearense.
Em Pindorama , nos nebulosos dias hodiernos , um dos pilares fundamentais da Democracia , soçobra sob a batuta de vetustos senhores que em nome de uma deusa , ora cega, surda e manca, impõem duras penas aos pobres e desvalidos cidadãos. Em contrapartida , acariciam com mimos uma corja de ricos malfeitores , a troco de um aliciante tilintar de moedas de ouro.
O povo pacato e ordeiro assiste, bovinamente , o afundamento de Pindorama num mar de lama e petróleo, já ouvindo o rufar dos tambores da Batalha Final do Armagedom !
Acorda , Pindorama !

segunda-feira, 4 de novembro de 2019


Não possuímos a vida ; ela nos possui
Nossa mente / corpo e toda a parafernália da tecnologia disponível não controlam tudo na Natureza. A única certeza é que não temos certeza nesse " mundo flutuante " dos antigos e no " mundo líquido " de Zygmunt Bauman ( 1925 - 2017 ).
" Aquele que deseja tomar o mundo e assim age, eu já vejo, não o conseguirá. O mundo é um recipiente espiritual , nada se pode fazer ! Quem age , ele o derrota.
Quem agarra, perde - o. Portanto, o Sábio nada faz, por isso nada o derrota, Nada agarra e por isso nada perde.
Por essa razão, as coisas pode ser que caminhem, pode ser que acompanhem ; pode ser que suspirem , pode ser que soprem seco; pode ser que sejam poderosas, pode ser que sejam frágeis; pode ser que sejam subjugadas, pode ser que sejam destrutivas. Portanto , o Sábio remove o muito, remove a extravagância, remove o extremo " ( Tao- Te- Ching).
Viver é mudar , adaptar - se , aproveitar cada etapa da vida e não ir contra as leis da Natureza !

Vejo o manto desta noite de domingo de novembro, iluminado por artefatos humanos, num raio de luminosas lágrimas, comemorando a chegada de Papai Noel num certo recanto de Fortaleza. Aqui no meu pequeno mundo fico a cismar condoído com pequenas crianças seminuas , deitadas em calçadas ou debaixo viadutos, exatamente , como o Menino Jesus na sua manjedoura de Belém.
"Dos berços de linho e seda/aos ninhos de palha podre,/onde houver uma criança ou um coração de criança/aí será o meu Natal./ Não no coração dos ricos que me exploram /que me ofendem, que me ignoram/ que me vendem quando aos pobres fazem mal;/não nas mesas dos tiranos, dos perversos, dos falsários,/ dos que matam, dos que enganam/ dos que abusam dos ingênuos para os fins mais desumanos/ como as guerras que se tramam com as armas mais letais;
Não nos corações malditos que me compram , que me escambam, / que me afligem nos aflitos/ e perseguem aos que eu amo: estes não terão Natal./ Meu Natal é dos humildes, é o Natal das lavadeiras,/dos porteiros, dos mendigos/dos policiais, dos serventes,/dos garis ,dos faxineiros, das enfermeiras que velam, / das professoras que educam, dos salva - vidas que salvam/dos que criam, dos que zelam pelos velhos que caducam:/ estes sim , terão Natal. Meu Natal é dos que sofrem; / dos doentes incuráveis; das amadas esquecidas; dos loucos irresponsáveis e das crianças perdidas.
Meu Natal é dos que lutam para viver nas cidades,/nos sertões despovoados , nas casas e nos casebres,/ nos abrigos e orfanatos, nas pocilgas e masmorras, / nos hospícios e hospitais, nos porões e albergues, / nas celas dos condenados, nas celas dos consagrados/nos berçários, nas igrejas, nas falas dos namorados/ nos presentes , nos brinquedos, mas sobretudo no homem, sim, nos filhos das mulheres.
Onde houver uma criança ou um coração de criança, /aí será meu Natal. Estarei por toda parte : nas penas dos que trabalham,/ nas portas das que se vendem, nas lágrimas dos que choram,/nos corações dos que cantam, nos olhares dos dementes./nos beliches e nas redes, nas esteiras e nas camas,/ sob os tetos, sob as pontes, sob as pedras, sob as luas /nos seios das que amamentam, nos ventres das que me esperam,/ na angústia das que me abortam, / no esquife das que morreram , onde houver uma criança,
Aí será meu Natal "
Meu Natal ( Paulo Gomide - 1912 - 1982 ).