terça-feira, 23 de fevereiro de 2016


FORTALEZA BELA E FERA

Fortaleza, a bela loira desposada do sol, de Paula Ney, hoje desamparada; os verdes mares bravios de José de Alencar, no momento engolindo almas; agigantada, com sirenes a clamar por socorro aos moucos ouvidos dos nossos homens públicos. Uma lástima! Algumas megalópoles saíram do inferno aplicando rigorosos esquemas de “ tolerância zero “ em segurança pública. Apalermados, assistimos hoje moleques esquálidos, desdentados, menores de idade, apoiados em leis e estatutos frouxos implantando a ordem da barbárie e do terror. Restam aos cidadãos de bem a injusta prisão em suas celas de cimento armado, parecendo uns “ políticos safados “ que cometeram crimes contra o patrimônio público: não descem para as masmorras da “ Papuda “ ou das “ Pedrinhas “ e ficam a perambular no breu das noites, feitos zumbis, fugindo aos contatos das gentes ditas normais.

Para aplacar a saudade de uma bucólica Fortaleza de antanho, 61 poetas elaboraram 79 composições como um mimo à Cidade de Nossa Senhora de Assunção, com o nome de Cancioneiro da Cidade de Fortaleza, no ano da 1953 sob a direção de Artur Eduardo Benevides, de onde extraímos dois belos exemplos de amor a esta Terra da Luz:

“ Fortaleza – cidade pequenina - / que eu conheci nos tempos de criança /sem mendigos , sem fome, na abastança /da mesa farta , variada e fina/ sem o avião que , no alto , ronca e dança /sem rádio ; sem o berro da buzina do automóvel/que espanta e que assassina /a sua vida era risonha e mansa /Fortaleza pousada sobre a areia /descalça e linda, refulgindo do alto /sob o mago esplendor da lua cheia / Fortaleza, pequena e engraçadinha/ de saia curta, taful , sem sobressalto /cantando o “ Dominé “ e a “ Cirandinha “ ... /           Fortaleza do Meu Tempo , composição de Gastão Justa .

“ Não tens Capibaribes ao luar / não tens ilhas defronte / não tens pontes/ não tens ventos terríveis, minuanos / não tens brumas, montanhas, nem fortins / és pobre, Cidade/ mas és bela /tens mistérios e muita adolescência/se contemplo teu vulto penso em rosas/ tenho pétalas em mim se te murmuro /quanto és mansa, e bucólica, e pura /e bela , e jovem , o’ grande flor atlântica / plantada mais em nós do que no chão ! / Cidade das velhas serenatas / das doces pastorinhas e fandangos /das retretas românticas, das valsas/de usanças que o tempo já não traz/ quem foi que sepultou teus violões / tuas cirandas , modinhas e quermesses / tuas festas de Reis , tuas lanternas / teus sobrados , serões e bandolins ?/ quanto sofro por ti , pois te desnudam / e te tornam uma girl made in U.S.A. / e já não ouves os sinos que te chamam/ para Nossa Senhora da Assunção/ Cidade de lagoas circundantes/ e de becos solitários e cruéis !/ Lagoa de Mondubim / Lagoa de Pirocaia/ Lagoa de Maraponga / Lagoa da Onça / Lagoa Feia / Lagoa do Tauape ! / na Praça do Ferreira – desvairada - / teu coração se encontra palpitando / e sofre as tuas dores e retém / a memória gentil da tua infância /Cidade essencial / cidade marítima / eu sempre te amei / tenho versos que um dia cantarei /às tuas praias amplas , ao teu mar / onde pousam jangadas e canções / Praia de Iracema /Praia do Mucuripe /Praia do Meireles / Volta da Jurema / Praia Formosa / Praia do Futuro /Praia do Pirambu! / oh! Os teus bairros tão doces e tranquilos /que recordam as canções dos seresteiros /Aldeota, Benfica, Alagadiço /Piedade, Prainha ,  Navegantes /Jacarecanga , Porangabussu !cidade de meus filhos, minhas lutas /meus exílios , desejos , solidões /cidade onde é possível o amor de outrora /chegar ao nosso olhar, claro e esquivo / e em nós ser como foi nos velhos tempos / profundo é o meu amor , oh ! Fortaleza/ e grávido de ti, tão vasto como/ teus céus escampos em setembro /em ti me guardo, guarda-te em mim/ minha pobre edelweiss, barco ancorado/minha guitarra se eu fora português! /        Canto de Amor a Fortaleza, poema de Artur Eduardo Benevides.

 

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