segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

ATAHUALPA YUPANQUI



“ Tu pensas que és distinto/ porque te dizem poeta/e tens um mundo aparte/ mais além das estrelas/de tanto mirar a lua/já nada sabes mirar/és como um pobre cego/ que não sabe aonde vai/vai mirar os mineiros/ os pobres no trigal/e cantai aos que lutam/ por um pedaço de pão/poeta de ternas rimas/vai viver na selva/e aprenderás muitas coisas/do candelabro e suas misérias /vive junto com o povo/não o mires por fora/que o primeiro é ser homem/ e o segundo, poeta/de tanto mirar a lua/já nada sabes mirar/és como um pobre cego/que não sabe aonde vai/vai mirar os mineiros/os pobres do trigal/e cante aos que lutam/ por um pedaço de pão “       O Poeta , letra e música de Atahualpa Yupanqui .
Héctor Roberto Chavero Haran nasceu na Argentina em 21 de janeiro de 1908, na província de Buenos Aires. Tornou- se Atahualpa (terra que anda) Yupanqui (o que conta, o que narra) numa homenagem ao último imperador do Império Inca morto pelos invasores brancos no ano de 1533. Seu pai era mestiço de origem quéchua e sua mãe descendente de bascos.
 “ Sou filho de crioulo e basco, levo em meu sangue o silêncio do mestiço e a tenacidade do basco “.
Héctor iniciou estudos de violino com um pároco e, posteriormente, aprendeu a tocar guitarra com Bautista Almiron, seu único mestre. Por conta da morte precoce de seu pai, o jovem teve que assumir várias atividades laborais para ajudar na manutenção da família: tipógrafo, mestre de escola, cronista e músico.
Em 1931 casou-se Héctor com Maria Alicia Martinez, tendo o casal gerado quatro filhos. Por essa época, Héctor empreendeu viagens em busca de testemunhos sobre velhas culturas da região e de seu rico folclore.
No ano de 1942, já com o casamento desfeito, Héctor conhece a pianista e compositora Antoinette Paule Fitzpatrick (1908 –1990) ou Nenette, que havia migrado de Paris para Buenos Aires. Deste fortuito encontro nasceria um romance duradouro e tempestuoso, entrecortado por separações, prisões, exílios e graves privações financeiras. No final, venceu a paixão através da tessitura de uma bela história de amor.
“ Eu tenho tantos irmãos/ que não os posso contar/ no vale , na montanha / nos pampas e no mar/cada qual com seus trabalhos/com seus sonhos , cada qual/com a esperança adiante/ com as recordações para trás/eu tenho tantos irmãos/ que não os posso contar/gente de mão calorosa/ por isso de amizade/com um choro para chorar/ com uma reza para rezar/com um horizonte aberto/que sempre está mais além/e essa força para buscar / com tesão e vontade/quando parece mais perto/é quando se afasta mais/eu tenho tantos irmãos/ que não os posso contar/assim seguimos andando/curtidos de solidão/nos perdemos pelo mundo/nos tornamos a encontrar/e assim nos reconhecemos /pelo distante mirar/pelo verso que mordemos/ semente de imensidão/e assim seguimos andando/ curtidos de solidão/e em nossos mortos/ para que ninguém fique para trás/eu tenho tantos irmãos/ que não os posso contar/ e uma irmã mui formosa /que se chama liberdade “  Tradução livre da canção Los Hermanos de Atauhalpa Yupanqui .
Na década de 70 do século passado, a música andina penetrou no Brasil através dos estados do sul nas vozes de Mercedes Sosa (1935 – 2009), Victor Jara (1932 – 1973), Violeta Parra (1917 – 1967) e outros, a embalar os sonhos de estudantes, trabalhadores e intelectuais que ansiavam por uma tal liberdade , rica iguaria  que andava em falta por quase toda a sofrida América Latina .
“ A partícula cósmica que navega em meu sangue/é um mundo infinito de forças siderais/veio a mim após um longo caminho de milênios/ quando , talvez, fui areia para os pés do ar/logo fui madeira, raiz desesperada/fundida no silêncio de um deserto sem água/depois fui caracol quem sabe de onde /e os mares me deram sua primeira palavra/depois a forma humana estendeu sobre o mundo /a universal bandeira do músculo e a lágrima /e cresceu a blasfêmia sobre a velha terra/ e o açafrão, e a tília , a estrofe e a oração /então vem a América para nascer em homem/ e me juntei ao pampa , a selva e a montanha/ se algum avô simples galopou até meu lugar de origem/ outro me contou histórias em sua flauta de madeira/eu não estudo as coisas nem pretendo lhes entender/ as reconheço, é certo, pois antes vivi nelas/converso com as folhas no meio dos montes/ e me dão suas mensagens as raízes secretas/e assim vou pelo mundo , sem idade nem destino/ ao amparo de um cosmos que caminha comigo/amo a luz,  e o rio, e o silêncio, e a estrela/ e floresço em guitarras porque já fui madeira “      Tradução livre do poema “ Tiempo del Hombre “ de autoria de Atahualpa Yupanqui .
Depois da morte de Nenette , sua querida companheira , ocorrida em 1990, descobriu-se que ela fora autora de cerca de 65 canções com Atahualpa, utilizando o nome fictício de Pablo del Cierro. Atahualpa Yupanqui correu o mundo divulgando sua música, voz, guitarra e poesia. Em 23 de maio de 1992 cala sua voz em Nímes na França, aos 84 anos de idade.



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