ATAHUALPA YUPANQUI
“ Tu pensas que és distinto/ porque te dizem poeta/e tens um
mundo aparte/ mais além das estrelas/de tanto mirar a lua/já nada sabes
mirar/és como um pobre cego/ que não sabe aonde vai/vai mirar os mineiros/ os
pobres no trigal/e cantai aos que lutam/ por um pedaço de pão/poeta de ternas
rimas/vai viver na selva/e aprenderás muitas coisas/do candelabro e suas
misérias /vive junto com o povo/não o mires por fora/que o primeiro é ser
homem/ e o segundo, poeta/de tanto mirar a lua/já nada sabes mirar/és como um
pobre cego/que não sabe aonde vai/vai mirar os mineiros/os pobres do trigal/e
cante aos que lutam/ por um pedaço de pão “ O Poeta , letra e música de Atahualpa
Yupanqui .
Héctor Roberto Chavero Haran nasceu na Argentina em 21 de
janeiro de 1908, na província de Buenos Aires. Tornou- se Atahualpa (terra que
anda) Yupanqui (o que conta, o que narra) numa homenagem ao último imperador do
Império Inca morto pelos invasores brancos no ano de 1533. Seu pai era mestiço
de origem quéchua e sua mãe descendente de bascos.
“ Sou filho de
crioulo e basco, levo em meu sangue o silêncio do mestiço e a tenacidade do
basco “.
Héctor iniciou estudos de violino com um pároco e,
posteriormente, aprendeu a tocar guitarra com Bautista Almiron, seu único
mestre. Por conta da morte precoce de seu pai, o jovem teve que assumir várias
atividades laborais para ajudar na manutenção da família: tipógrafo, mestre de
escola, cronista e músico.
Em 1931 casou-se Héctor com Maria Alicia Martinez, tendo o
casal gerado quatro filhos. Por essa época, Héctor empreendeu viagens em busca
de testemunhos sobre velhas culturas da região e de seu rico folclore.
No ano de 1942, já com o casamento desfeito, Héctor conhece
a pianista e compositora Antoinette Paule Fitzpatrick (1908 –1990) ou Nenette,
que havia migrado de Paris para Buenos Aires. Deste fortuito encontro nasceria
um romance duradouro e tempestuoso, entrecortado por separações, prisões,
exílios e graves privações financeiras. No final, venceu a paixão através da
tessitura de uma bela história de amor.
“ Eu tenho tantos irmãos/ que não os posso contar/ no vale ,
na montanha / nos pampas e no mar/cada qual com seus trabalhos/com seus sonhos
, cada qual/com a esperança adiante/ com as recordações para trás/eu tenho
tantos irmãos/ que não os posso contar/gente de mão calorosa/ por isso de
amizade/com um choro para chorar/ com uma reza para rezar/com um horizonte
aberto/que sempre está mais além/e essa força para buscar / com tesão e
vontade/quando parece mais perto/é quando se afasta mais/eu tenho tantos
irmãos/ que não os posso contar/assim seguimos andando/curtidos de solidão/nos
perdemos pelo mundo/nos tornamos a encontrar/e assim nos reconhecemos /pelo
distante mirar/pelo verso que mordemos/ semente de imensidão/e assim seguimos
andando/ curtidos de solidão/e em nossos mortos/ para que ninguém fique para
trás/eu tenho tantos irmãos/ que não os posso contar/ e uma irmã mui formosa
/que se chama liberdade “ Tradução livre
da canção Los Hermanos de Atauhalpa Yupanqui .
Na década de 70 do século passado, a música andina penetrou
no Brasil através dos estados do sul nas vozes de Mercedes Sosa (1935 – 2009),
Victor Jara (1932 – 1973), Violeta Parra (1917 – 1967) e outros, a embalar os
sonhos de estudantes, trabalhadores e intelectuais que ansiavam por uma tal liberdade
, rica iguaria que andava em falta por
quase toda a sofrida América Latina .
“ A partícula cósmica que navega em meu sangue/é um mundo
infinito de forças siderais/veio a mim após um longo caminho de milênios/
quando , talvez, fui areia para os pés do ar/logo fui madeira, raiz
desesperada/fundida no silêncio de um deserto sem água/depois fui caracol quem
sabe de onde /e os mares me deram sua primeira palavra/depois a forma humana
estendeu sobre o mundo /a universal bandeira do músculo e a lágrima /e cresceu
a blasfêmia sobre a velha terra/ e o açafrão, e a tília , a estrofe e a oração
/então vem a América para nascer em homem/ e me juntei ao pampa , a selva e a
montanha/ se algum avô simples galopou até meu lugar de origem/ outro me contou
histórias em sua flauta de madeira/eu não estudo as coisas nem pretendo lhes
entender/ as reconheço, é certo, pois antes vivi nelas/converso com as folhas
no meio dos montes/ e me dão suas mensagens as raízes secretas/e assim vou pelo
mundo , sem idade nem destino/ ao amparo de um cosmos que caminha comigo/amo a
luz, e o rio, e o silêncio, e a estrela/
e floresço em guitarras porque já fui madeira “ Tradução livre do poema “ Tiempo del
Hombre “ de autoria de Atahualpa Yupanqui .
Depois da morte de Nenette , sua querida companheira ,
ocorrida em 1990, descobriu-se que ela fora autora de cerca de 65 canções com
Atahualpa, utilizando o nome fictício de Pablo del Cierro. Atahualpa Yupanqui
correu o mundo divulgando sua música, voz, guitarra e poesia. Em 23 de maio de 1992
cala sua voz em Nímes na França, aos 84 anos de idade.
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