sexta-feira, 11 de novembro de 2022

 A Medicina em Baturité no Século Passado

Em frente à Estrada de Ferro em Baturité , no Ceará, ficava um restaurante , pertencente à própria Estrada , e que se achava arrendado , há muitos anos , a uma velha e gorda senhora , conhecida pelo apelido de Sinhá. Recebendo hóspedes que alojava na sua residência situada na rua contígua, com o nome de " Hotel Sinhá ".
Foi ali , nesse hotel, que me hospedei, em 1906. Sobrecarregado de enfermidades , trazia eu do Pará, uma carga de paludismo , o fígado inflamado , uma neurastenia aguda , e uma asma renitente .
Dona Sinhá, como enfermeira , apresentava apenas o inconveniente de conhecer maior número de remédios do que aquele que se tornava necessário para enterrar um doente .
- Se o senhor não ficar bom aqui em casa , pode perder a esperança da cura , porque não arranjará saúde em parte alguma do mundo .
Para o fígado comecei a comer frutas de Jurubeba , para a fraqueza, suco de carne , e para a asma, usava chá de alecrim com leite de mulher.
Certa feita , um frio espalhou - se por todo o meu corpo, e eu não tive tempo senão dizer :
- Estou morrendo.
- Não é nada , não ! - animou - me Dona Sinhá.
- Foi uma "piloura". Uma espécie de vertigem .
Baturité possuía na época, três doutores ( Galdino Ramos , Cabral , e , João Paulino ) .
Mas havia , também, o Jorge , curandeiro e famoso fabricante de "garrafadas" .
Um dia , Jorge , entra no Hotel Sinhá, apressadamente , a caminho da cozinha . Havia vendido todas as suas garrafadas , e precisava de uma urgente , para não perder o freguês. Misturou numa garrafa , café e cachaça , e ali estava uma " garrafada de emergência ". Para o vulgo, a ciência deve ser infalível. E como nem sempre a medicina cura o enfermo , entra o curandeiro , pois para ajudar a morrer , todo mundo serve.
Excertos da crônica " A Medicina de Baturité " , que integra o livro " Contrastes " ( 1945 ), da autoria de Humberto de Campos ( 1886 - 1834 ), nascido em Miritiba, no Maranhão. Jornalista, crítico literário, contista, poeta e memorialista . Pertenceu à Academia Brasileira de Letras.
Hodiernamente , nações que pelejam com males que não são simples " pilouras" , devem fugir de curandeiros fazedores de garrafadas a base de cachaça , propaladas , falsamente , como tábua de salvação.
Uma nação nunca deve ter direito de cometer suicídio !
Pode ser uma imagem de ao ar livre
Tereza Neuman Oliveira e Lúcia Brandão
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