quinta-feira, 12 de outubro de 2017

DIA DOS ANJINHOS





Dia 12 de outubro, povoando os cruzamentos de avenidas nos bairros ricos de Fortaleza, ano após ano, a triste cena se repete, comove e clama por um fim. Uma legião de anjinhos, famélicos, esfarrapados, estende a mão num silêncio ensurdecedor, expondo uma chaga aberta no peito há séculos: a cruel injustiça social. Um verdadeiro tapa na cara daqueles que planejam os falidos programas de esmolas, incluindo as tais famigeradas bolsas. Esses pobres anjinhos serão um dia, não distante, alcançados pela cruel máquina de triturar gentes, morrendo prematuramente de susto, bala ou vício.

“A esta hora exatamente/há uma criança na rua/há uma criança na rua/é honra dos homens proteger o que cresce/cuidar que não haja infância dispersa pelas ruas/evitar que naufrague seu coração de barco/sua incrível vontade de pão e chocolate/colocar uma estrela no lugar da fome/caso contrário é inútil, caso contrário é um absurdo/ensaiar na terra a alegria e a música/porque de nada vale, se há uma criança na rua”.

“ Todo o tóxico do meu país entra pelo meu nariz/lavo carros, limpo sapatos, cheiro cola e também uso crack/roubo carteiras, mas sou gente fina, sou um sorriso sem dentes/chuva sem teto, unha com terra, sou o que sobrou da guerra/um estômago vazio, um golpe no joelho que se cura com o frio/o melhor guia turístico da redondeza/por três moedas te guio pela capital/não preciso de visto para voar pelos arredores/porque brinco com aviões de papel/arroz com pedra, frango com vinho, e o que me falta eu imagino/não deve andar o mundo com amor descalço/acenar com um jornal com uma carta na mão/subindo nos trens, substituindo o riso/batendo-nos no peito com um lado cansado/não deve andar a vida recém-nascida, a preço/a infância arriscada por uma extrema ganância/porque, então, as mãos são fardos inúteis/e o coração, apenas uma pobre palavra/quando cai a noite, durmo acordado, com um olho fechado e o outro aberto/porque senão os tigres me mandam um balaço/minha vida é como um circo, mas sem palhaço/vou caminhando pelas ruas fazendo malabares com cinco laranjas/pedindo moedas a todos numa bicicleta de uma só roda/sou oxigênio para este continente/sou o que o presidente descuidou/não se assuste se tenho mal hálito, se me vês sem camisa com as tetas ao vento/sou um elemento a mais na paisagem/os resíduos da rua sem camuflagem/como alguma coisa que existe, mas de mentira/algo sem vida, mas que respira/pobres são aqueles que se esqueceram de que há crianças na rua/que há milhões de crianças que vivem na rua/e muitas crianças que crescem nas ruas/eu os vejo apertando seu pequeno coração/mirando-nos a todos com uma fábula nos olhos/um relâmpago truncado cruza seus olhos/porque ninguém protege a vida que cresce/e o amor faz-se perdido, como uma criança solta na rua “.

Tradução livre da música “ Hay un niño en la calle”.



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