sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

BRASIL 1918 – O ANO DO JECA TATU




1918: O intimorato Monteiro Lobato (1882-1948), alcança retumbante êxito com um livro de contos “Urupês”, ambientado numa fazenda de café em São Paulo onde sobressai a famélica figura do caipira, o Jeca Tatu, cujos males decorrem da falta de saúde, instrução e de assistência: “Perdoa, pois, pobre opilado e crê no que te digo ao ouvido: tens no sangue e nas tripas todo um jardim zoológico...és tudo isto sem tirar uma vírgula, mas ainda és a melhor coisa desta terra. Os outros, os que falam francês e, senhores de tudo, te mantêm nesta gueena infernal para que possam, a seu salvo, viver vida folgada à custa de teu dolorido trabalho, esses, meu caro Jeca Tatu, esses têm na alma todas as verminoses que tu tens no corpo. Doente por doente, antes tu, doente só de corpo.”

Belisário Penna (1868-1939), médico sanitarista brasileiro, publica Saneamento do Brasil, uma coletânea de artigos de jornal, esforçando-se em vão para criar uma consciência sanitária na classe médica brasileira. Denuncia as doenças generalizadas e o alcoolismo como responsáveis pela apregoada indolência e incapacidade dos brasileiros. Mas denuncia, também, a indiferença e irresponsabilidade dos governos. Chega a pedir para o povo brasileiro o cuidado com a saúde e a alimentação e para com o apuro da raça que se dá ao boi e ao parco. Propõe, ainda, uma taxa de saúde a ser aplicada sobre os duzentos e cinquenta milhões de litros de cachaça que se consomem anualmente. Assevera:- Somos o país da vida mais cara e de menores salários do mundo.

Mário de Andrade (1893-1945), dá a primeira mostra de que nasceu diferente, com um artigo em defesa da preguiça na história.

Excertos retirados do livro Aos Trancos e Barrancos, de autoria do irrequieto político, intelectual, antropólogo, comunista, escritor e ateu Darcy Ribeiro (1922-1997), publicado em 1985 pela Editora Guanabara.

De 1918 para cá surgiram no horizonte da saúde pública brasileira, novas mazelas a perseguirem “jecas turbinados com bolsas do governo”, ainda, infelizmente, abrigando nas tripas um verdadeiro jardim zoológico, num Brasil pontuado por 

“Áfricas e Europas” assistidos por muitos “maus médicos”, sem diplomas. Uma medicina, onde convivem, lado a lado, a exuberância tecnológica e a falta de humanidade na assistência ao enfermo. Quanto à preguiça defendida por Mário Andrade, esta fincou as garras nos arraiais do governo, onde pouco se obra e muito se rapina.

Mais um século perdido, pelo gigante país do futuro, oxente!

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