URUBUS, DE JOÃO OTÁVIO LOBO
“ Não sei se
todos, em criança, tivemos esta casta volúpia: olhar urubus voando...Naqueles
tempos, quando a sombra da velha casa do “ Canto Alegre” crescia na calçada da
frente, eu me estirava em um couro de ovelha, e pascia a vista no côncavo do
azul. Mas longe, bem no alto, onde a distância vai matando o agudo dos
contornos, passa sereno um camiranga (urubu).
Fisgo- lhe os olhos, dando linha
no infinito, qual fora um encantado papagaio de papel. E a nódoa vai minguando
até um pingo de ponto, enterrando- se no céu, como alfinete em almofada de
veludo. Outros surgem, peneirando no ar, gizando curvas morosas, virguladas de
reentrâncias e pontuadas de indecisões, até que rumam o horizonte sem fim.
Vezes há, tolda o levante um entrecruzar de asas delgadas como lâminas sarjando
o espaço.
Por vezes, no equilíbrio do voo, retraem de momento os encontros, em
um espreguiçar de cansaço. De raro, da altura, em arremesso de flecha, asas
fechadas, dispara um tinga (urubu) zunindo. São urubus em raid. Monótonos,
negros, na majestade do voo, pairam acima das contingências da terra.
Hoje,
espelham a imagem da vida. Altos e inacessíveis, perpassam como as ilusões
inatingíveis e fugidias.
Quem,
desgraçado mortal ousa alcança-las, objetivando um sonho, sente o fastio do
real, a decepção talvez de ver urubus em marcha “
Urubus, de
João Otávio Lobo (1892- 1962).
Crônica que
evoca recordações de infância onde urubus – aves que se alimentam de carniça- voando alto, solenes, são os reis do espaço,
quase inatingíveis. Refletem a própria vida a nos dar lições de venturas e
desventuras.
Hoje em
Pindorama, figuras “negras” que se alimentam de” lixo”, colocam em risco a
sobrevivência da nação: tanto
representantes do povo (políticos malandros), como uns poucos senhores togados,
vorazes em dar liberdade a quem não merece, ao arrepio da lei, por se julgarem
deuses inalcançáveis.
João Otávio
Lobo, nasceu no município de Santa Quitéria, no interior do Ceará no dia 04 de
novembro de 1892.
Estudou no Seminário da Prainha, em Fortaleza. Graduou-se em
medicina na Faculdade da Praia Vermelha da Universidade do Rio de Janeiro. Em
1927 empreendeu viagem com destino à Alemanha para aperfeiçoar estudos em
doenças do pulmão.
Exerceu a arte hipocrática com denodo e afinco. Pôs sua
inteligência a serviço da política partidária atuando como Presidente da Assembleia,
Vice-Presidente do Estado, Deputado Federal, Secretário do Interior e Justiça.
O Dr. Otávio
Lobo integrou a Academia Cearense de Letras, cadeira de número 18 e a Academia
Cearense de Medicina, cadeira número 16.
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