O POETA
GONÇALVES DIAS E O CEARÁ
“ Minha
terra tem palmeiras/onde canta o Sabiá/as aves, que aqui gorjeiam/não gorjeiam
como lá/nosso céu tem mais estrelas/nossas várzeas tem mais flores/nossos
bosques têm mais vida/nossa vida mais amores/em cismar, sozinho, à noite/mais
prazer eu encontro lá/minha terra tem palmeiras/onde canta o sabiá/minha terra
tem primores/que tais não encontro eu cá/em cismar sozinho, à noite/mais prazer
eu encontro lá/minha terra tem palmeiras/onde canta o sabiá/não permita Deus
que eu morra/sem que eu volte para lá/sem que desfrute os primores/que não
encontro eu cá/sem que ainda aviste as palmeiras/onde canta o sabiá” Canção do exílio de Gonçalves Dias (1847)
Antônio
Gonçalves Dias (1823 – 1864) nasceu em Caxias, no Maranhão, em 10 de agosto de
1823. Seu pai era português de nascimento e a mãe, uma cafuza, isto é, mestiça
fruto do cruzamento do índio com o negro, que lhe foi cuidadora extremosa. Após
seus estudos básicos na sua terra natal, o jovem Antônio transferiu-se para Portugal
onde se bacharelou em Direito pela Universidade de Coimbra. Em 1845 retornou ao
Brasil para lapidar sua brilhante e fugaz trajetória de jornalista, etnólogo,
latinista, poeta e historiador. Foi lente de Corografia e História do Brasil do
Imperial Colégio Pedro II, ocupando uma cadeira que em 1883, seria regida pelo
nobre cearense João Capistrano de Abreu, após memorável peleja.
Por duas
vezes o poeta indianista Gonçalves Dias visitaria o Ceará. Em 1851, como
funcionário graduado do Governo Central para inspecionar o Liceu do Ceará, onde
se demorou uns poucos dias. Em 1859 retornaria a capital cearense chefiando a
Secção de Etnografia da famosa Comissão Científica de Exploração patrocinada
pelo idealismo de D. Pedro II. Tal comitiva era destinada a estudos geológicos,
hidrográficos, botânicos e hidrológicos em estados do Norte do Brasil. A
chegada a Fortaleza deu-se no dia 4 de fevereiro de 1859, a bordo do vapor
Tocantins e os ilustres cientistas ficaram hospedados em um casarão que seria a
futura sede do Excelsior Hotel no centro da cidade. Como se verificou,
posteriormente, um lugar propício para o pleno exercício da atividade boêmia.
Conta-se que, certa feita, algumas destas figuras estrambóticas, tomaram banho
de mar, nus em pelo, nas proximidades do Passeio Público. Um vexame total!
O poeta
Gonçalves Dias, com sua alma atormentada por males físicos e amorosos, não
levava a sério o desenrolar da dita expedição. Após seis meses de permanência
em Fortaleza, o poeta deslocou-se para a vizinha cidade de Baturité e,
posteriormente, para Quixeramobim. Alguns anos depois, coincidentemente, o
meta-poeta pernambucano Manuel Bandeira procuraria os bonançosos ares de
Quixeramobim para dar combate a uma renitente tuberculose pulmonar, a
famigerada Peste Branca. De pitoresco, a viagem de Gonçalves Dias com destino a
Baturité teve início no lombo de um exótico dromedário, um dos 14 animais que
aqui aportaram vindos da África, na companhia de quatro argelinos. A ideia era
introduzir o dromedário no Ceará para substituir o cavalo e o jumento por outro
mais resistente à fome e à sede. Não vingou, posto que, os pobres animais
africanos morreram todos em decorrência de infecções iniciadas nos pés dos
mesmos em contato com o pedregoso e adusto chão do Ceará. Em agosto de 1860, o
poeta Gonçalves Dias, deixava o solo de Alencar, definitivamente.
A 3 de
novembro de 1864, a bordo do navio Ville de Boulogne, vindo da Europa, onde
fora buscar tratamento para seus males, perece afogado o atormentado poeta
Antônio Gonçalves Dias, aos 41 anos de idade, “ sem encontrar com as palmeiras
onde canta o sabiá”. Fora, infelizmente, a única vítima fatal deste acidente
naval nos baixos dos Atins, próximos ao farol de Itacolomi!
O gigante português, Camillo Castelo Branco
(1825 – 1890) deixa assinalado sobre o acontecimento trágico:
“ Gonçalves
Dias morreu coroado imperador da lira americana; sumiu-se tragicamente no mar,
como Elias no azul, quando seu nome era símbolo da musa cisatlântica e a sua
vida um pouco falida de dinheiro, uma glória nacional... Gonçalves Dias, o
portentoso poeta, o prosador inviolável na pureza da dicção... tem dois
monumentos: um de mármore na sua pátria; outro nos livros são d’ela, que são
nossos, que os temos na memória do coração desde a mocidade “
Nenhum comentário:
Postar um comentário