A Volta das Andorinhas l
"Dias antes o sol sanhudo e encandescente /havia fulminado inexoravelmente /com seu olhar de fogo e vastidão do solo/beijara doidamente o enfebrecido colo/da serrania adusta, e andara pelos montes/sugando a última gota às desoladas fontes/roubara de um só trago as pérolas do orvalho/a descorada flor/pusera em cada galho/um gesto de terror e desespero /enchera de dor e de nudez a altiva cajazeira /de folhagem despida /a amarelenta grama /parecia um lençol intérmino de chama/fumegante a ondular pela planície afora/
Mas que transformação e que mudança, agora/que frescura de espaço e que harmonia ingente /ai como tudo canta e ri gostosamente /do céu, tal qual uma taça azul, de porcelana, enorme, um sol bondoso e louro se espadana /sobre a floresta e o mar e o rio e o vale e a serra /- dourado elo de amor unindo o céu e a terra/foi - se o fulvo rancor do seu olhar radiante/agora ele é o fiel, o estremecido amante /da natureza, e tem um riso dulcoroso /que inunda de ebriez, de um amável gozo /de carícias gentis a terra e os corações /rejuvenesce o campo :em niveos borbotões /atravessando a estrada, o múrmuro regato /oculta - se a gemer, na densidão do mato/há pegadas de chuva impressas sobre a areia / e pela várzea afora o gado pinoteia /e muge festival. Tudo renasce/às cores das alfombras, do céu, das pedras e das flores/tem uma nitidez esplêndida e vibrante /o velho lavrador, feliz, risonho, diante do pujante /esplendor da natureza, sente/um raio de esperança enche - lo, e, ansiosamente, voa ao roçado e cava/eis plantado o legume /-um pendor da abundância! /Em célere cardume, as borboletas vão, insôfregas, acesas/numa sede de aroma, a voar pelas devezas /confundindo o matiz das asas irrequietas/às flores do vergel -imóveis borboletas /há orgia de sons e luz pela espessura/e longe, os urubus adejam pela altura/- negros traços sutis na tela da amplidão /mais abaixo desliza a plácida legião /dos maranhões, descubro agora uma andorinha/pousada no beiral ondeado da casinha/e uma outra a recortar garbosamente os ares/Assim como a andorinha aos nossos doces lares/voltou de novo após saudosa romaria//que fez, quando uma dor terrífica pungia/este amado torrão, e agora o espaço cruza / e pousa nos beirais; também a minha musa/- que vive de verdadeiras esperanças minhas/saudosa regressou : voltou com as andorinhas!"A Volta das Andorinhas , de autoria do poeta cearense Antônio Sales (1868 - 1940) e publicado no jornal A Quinzena , propriedade do Clube Literário, em Fortaleza, no dia 31 de janeiro de 1888.
Mas que transformação e que mudança, agora/que frescura de espaço e que harmonia ingente /ai como tudo canta e ri gostosamente /do céu, tal qual uma taça azul, de porcelana, enorme, um sol bondoso e louro se espadana /sobre a floresta e o mar e o rio e o vale e a serra /- dourado elo de amor unindo o céu e a terra/foi - se o fulvo rancor do seu olhar radiante/agora ele é o fiel, o estremecido amante /da natureza, e tem um riso dulcoroso /que inunda de ebriez, de um amável gozo /de carícias gentis a terra e os corações /rejuvenesce o campo :em niveos borbotões /atravessando a estrada, o múrmuro regato /oculta - se a gemer, na densidão do mato/há pegadas de chuva impressas sobre a areia / e pela várzea afora o gado pinoteia /e muge festival. Tudo renasce/às cores das alfombras, do céu, das pedras e das flores/tem uma nitidez esplêndida e vibrante /o velho lavrador, feliz, risonho, diante do pujante /esplendor da natureza, sente/um raio de esperança enche - lo, e, ansiosamente, voa ao roçado e cava/eis plantado o legume /-um pendor da abundância! /Em célere cardume, as borboletas vão, insôfregas, acesas/numa sede de aroma, a voar pelas devezas /confundindo o matiz das asas irrequietas/às flores do vergel -imóveis borboletas /há orgia de sons e luz pela espessura/e longe, os urubus adejam pela altura/- negros traços sutis na tela da amplidão /mais abaixo desliza a plácida legião /dos maranhões, descubro agora uma andorinha/pousada no beiral ondeado da casinha/e uma outra a recortar garbosamente os ares/Assim como a andorinha aos nossos doces lares/voltou de novo após saudosa romaria//que fez, quando uma dor terrífica pungia/este amado torrão, e agora o espaço cruza / e pousa nos beirais; também a minha musa/- que vive de verdadeiras esperanças minhas/saudosa regressou : voltou com as andorinhas!"A Volta das Andorinhas , de autoria do poeta cearense Antônio Sales (1868 - 1940) e publicado no jornal A Quinzena , propriedade do Clube Literário, em Fortaleza, no dia 31 de janeiro de 1888.
Viva !
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