BRASIL (AINDA) UM IMENSO HOSPITAL
Miguel da Silva Pereira (1871 – 1918), médico brasileiro sanitarista, professor universitário e membro da Academia Nacional de Medicina, no dia 10 de outubro de 1916 proferiu uma vibrante saudação ao Dr. Aloysio de Castro, diretor da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Seguem trechos de sua profética e atual oratória:
“ Vivemos tristemente em um país triste. As nossas desditas políticas e as nossas misérias administrativas cedo, apenas conscientes da vida nacional, nos envenenam as fontes de alegria, de onde deveriam haurir reservas de energias físicas e morais indispensáveis à nossa dignidade de povo independente. Nesta atmosfera pesada e ansiosa, deprimente e duvidosa, onde respiram a fôlego curto 25 milhões de brasileiros , foi bastante que ao aceno de um poeta se entreabrissem as cortinas que aos moços patrícios vedavam o olhar para além de seus interesses subalternos , para que vissem aterrados a imagem sagrada da pátria – exposta e sem defesa , imensa e sem grandeza, espoliada e sem justiça , rica e sem crédito , culta e sem escolas , forte e sem armas – miserável e maltrapilha , ela , a mãe augusta e fecunda que na hora tenebrosa do perigo não encontrará para defende- la senão exatamente aqueles que não engordam à custa de sua desgraça ...
Na luta pela pátria, todos se acamaradam e emparceiram como diante da morte, que essa luta tantas vezes preludia, todos se nivelam na terra profunda. E bem que se organizem milícias, que se armem legiões, que se cerrem fileiras em torno da bandeira, mas, melhor seria que não se esquecessem neste paroxismo de entusiasmo que fora do Rio ou de São Paulo, capitais mais ou menos saneadas, e de algumas outras cidades em que a previdência superintende a higiene, O BRASIL AINDA É UM IMENSO HOSPITAL. Num impressionante arroubo de oratória já perorou na Câmara ilustre parlamentar que, se fosse de mister, iria ele de montanha em montanha, despertar os caboclos desses sertões. Em chegando a tal extremo zelo patriótico uma grande decepção sua generosa e nobre iniciativa. Parte , e parte ponderável , dessa brava gente não se levantaria ; inválidos , exangues , esgotados pela ancilostomose e pela malária ,estropiados e arrasados pela moléstia de Chagas ; corroídos pela sífilis e pela hanseníase ; devastados pelo alcoolismo ; chupados pela fome , ignorantes , abandonados , sem ideal e sem letras ou não poderiam estes tristes deslembrados se erguer da sua modorra ao apelo tonitruante de trombeta guerreira, ressoando de quebrada em quebrada , como espectros , se levantassem , não poderiam compreender porque a Pátria, que lhes negou a esmola do alfabeto , lhes pede agora a vida e nas mãos lhes punha, antes do livro redentor , a arma defensiva “ .
Tal mensagem patriótica exarada há exatos 100 anos permanece atual e verdadeira. Hoje a nação brasileira contando com cerca de 203.000.000 de almas continua como um grande e mal gerido hospital, obrigado a conviver com novas e furtivas mazelas: o “ cancro da corrupção” (uma verdadeira besta do Apocalipse) e novas doenças como Aids, Dengue, Chikungunya e Zika . Esta última a percorrer o território nacional, agora, de norte a sul trazendo consigo inocentes almas afetadas com microcefalia e outros agravos. Distantes estamos de uma solução razoável para tão vergonhoso problema, num país manietado, letárgico, assistindo aos três poderes se digladiarem em torpes pelejas. Até quando?
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