Pagu , Uma Mulher Impossível
" Pagu tem uns olhos moles / uns olhos de fazer doer / bate - coco quando passa / coração passa a bater / eh , Pagu , eh ! / dói porque é bom de fazer doer / passa e me puxa com os olhos / provocantissimamente / mexe - mexe , bamboleia / pra mexer com toda gente / eh , Pagu , eh ! / dói porque é bom de fazer doer / toda gente fica olhando / o seu caminhar de vai - vem / umbilical e molengo/ de não- sei - o - que - é- que - tem / eh , Pagu , eh ! / dói porque é bom de fazer doer / quero porque te quero / nas formas do bem - querer / querzinho de ficar junto / que é bom de fazer doer / eh , Pagu eh ! / dói porque é bom de fazer doer " .
Poema " Coco " de autoria de Raul Bopp ( 1898 - 1984 ) .
Cabelos compridos , forte maquiagem nos olhos , lábios exageradamente rubros , olhar penetrante e desafiador : assim era Pagu ; blusa transparente , fumando em público e decompondo com afiados palavrões .
Uma mulher impossivel !
Um anjo torto que sonhava com um mundo livre , utópico , sem fronteiras e igualitário . Assim nasceu Patrícia Rehder Galvão ( 1910 - 1962 ) , em São João da Boa Vista , São Paulo. Seus pais foram : Thiers Galvão de França , e Adélia Rehder Galvão .
Aos 4 anos de idade , Patrícia transferui - se com a família para a capital paulista, onde foi aluna do poeta e folclorista Mário de Andrade , no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo . Teve uma infância tranquila e livre , mas na adolescência passou a se destacar entre seus pares por um comportamento atípico e arrojado para a época . Passou em branco , de raspão , pela chocante Semana da Arte Moderna ( 1922 ) , curtindo seus mimosos 12 anos de idade .
Em 1929 , graduou-se pela Escola Normal da Praça da República . A novel " Normalista " estava habilitada a ensinar crianças do curso primário . Vestida de azul e branco , era proibida de casar , por regulamento escolar , porém alegrava a paisagem paulistana com seu frescor juvenil e angelical .
" Vestida de azul e branco / trazendo um sorriso franco / no rostinho encantador / minha linda normalista / rapidamente conquista / meu coração sem amor / eu que trazia fechado / dentro do peito guardado / meu coração sofredor / estou bastante inclinado / a entregá - lo aos cuidados / daquele brotinho em flor / mas a normalista linda / não pode casar ainda / só depois de se formar / eu estou apaixonado / o pai da moça é zangado / e o remédio é esperar " .
Canção " A Normalista " , da autoria de Benedito Lacerda e David Nasser .
O Movimento Antropofágico de 1928 , a radicalização de 1922 , considerado a segunda dentição daquela vanguarda , abraçou a adolescente Patrícia ( 18 anos ) , tendo como padrinhos o casal Oswald de Andrade ( poeta ) e Tarsila do Amaral ( pintora ) . O poeta Raul Bopp ( 1898 - 1984 ) , cria o nome Pagu, pensando de forma errônea que o nome da garota fosse Patrícia Goulart . Não importa , pois assim ficou consagrado .
Em 1929 , Pagu ( 20 anos ) e Oswald de Andrade ( 40 anos ) passam a viver juntos , para escândalo da sociedade paulistana conservadora .
" Se o lar de Tarcila, vacila/ é pelo angu de Pagu " .
Teria escrito num guardanapo o apaixonado Oswald . Os pombinhos Oswald e Pagu , enfim , casam - se no Cemitério da Consolação no dia 5 de janeiro de 1930 .
Em setembro nasce o menino Rudá ( o deus do amor , de lendas indígenas) . Pagu deixa o filho de 3 meses de idade , aos cuidados do pai , e parte para Buenos Aires , para um encontro com Luis Carlos Prestes , o famigerado " Cavaleiro da Esperança " .
Em 1931 , deu - se a primeira prisão política de Pagu , na cidade de Santos , São Paulo . Daí seguiram - se mais de duas dezenas de pousos em cárceres . Encontramos Pagu em 1932 , morando numa vila Operária no Rio de Janeiro , trabalhando como lanterninha de cinema e tecelã . Em 1934 , Pagu lança um romance de forte cunho social , " Parque Industrial " . Neste mesmo ano , dá por encerrado o casamento com Oswald de Andrade .
Pagu, em seguida contrai matrimônio com o jornalista Geraldo Ferraz , e no ano seguinte , torna - se mãe de mais um garoto , Geraldo Galvão Ferraz .
Em 1952 , Pagu frequenta a Escola de Arte Dramática de São Paulo . Passa a traduzir e dirigir peças teatrais, e torna - se a primeira mulher presidente da União do Teatro Amador , de Santos . Trabalha , ainda , em jornal , revista e televisão .
Em 12 de dezembro de 1962 , Pagu , abre caminho para uma nova utopia , rumo ao multiverso , na cidade de Santos , rodeada de familiares, por conta de um traiçoeiro câncer.
Rita Lee , e , Zélia Duncan , duas " Pagus " pós- modernas , livres e belas , homenageiam a eterna Pagu , com um mimo musical :
" Mexo , remexo na Inquisição / só quem já morreu na fogueira / sabe o que é carvão/ eu sou pau para toda obra / Deus dá asas a minha cobra / minha força não é bruta / não sou freira , nem sou puta / porque nem toda feiticeira é corcunda / nem toda brasileira é bunda / meu peito não é de silicone / sou mais macho que muito homem / sou rainha do meu tanque / sou Pagu indignada no palanque / fama de porra - louca , tudo bem / minha mãe é Maria Ninguém / não sou atriz , modelo , dançarina / meu buraco é mais em cima " .
Ponto Final !
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