Antero de Quental e Fernando Pessoa
Cheia de Graça , Mãe Misteriosa
" Num sonho todo feito de incerteza,
É que eu vi teu olhar de piedade
E ( mais que piedade ) de tristeza ...
Não era o vulgar brilho da beleza ,
Nem o ardor banal da mocidade ...
Era outra luz , era outra suavidade ,
Que até nem sei se as há na natureza ...
Um místico sofrer ...uma ventura
Feita só do perdão , só da ternura
E da paz da nossa hora derradeira ...
Ó visão , visão triste e piedosa !
Fita - me assim calada , assim chorosa...
E deixa - me sonhar a vida inteira !
Soneto " Á Vida Santíssima " , autoria de Antero de Quental ( 1842 - 1891 ) .
" O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda ,
E de vez em quando olhando para trás..
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto ,
E eu sei dar por isso muito bem ...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se , ao nascer ,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto - me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo ...
Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo . Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se faz para pensarmos nele
( Pensar é estar doente dos olhos )
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo ...
Eu não tenho filosofia : tenho sentidos ...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é ,
Mas porque a amo , e amo - a por isso ,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama , nem o que é amar ..
Amar é eterna inocência ,
E a única inocência é não pensar ..."
Poema de Fernando Pessoa ( 1888 - 1935 ).
Na minha oficina de trabalho , muito bem acompanhado aqui e no multiverso !
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