Anjinhos na Chuva
Manhã de chuva forte em Fortaleza , nesta Sexta-feira Santa , e por volta de oito horas , dois anjinhos de cabelos coloridos de ouro , soltos numa alegria contagiante , tomando banho na correnteza d'água que cai das torneiras de São Pedro , deitados rente à coxia , na Avenida Virgílio Távora , na Aldeota .
Imitando , sem querer , os petizes , parei meu carro por conta de lágrimas que rolaram mornas , banhando o meu corpo e alma .
" A esta hora exatamente / há uma criança na rua / há uma criança na rua / é honra dos homens proteger o que cresce / cuidar que não haja infância dispersa pelas ruas/ evitar que naufrague seu coração de barco/ sua incrível vontade de pão e chocolate/ colocar uma estrela no lugar da fome/ caso contrário , é inútil, caso contrário é um absurdo/ ensaiar na terra a alegria e a música/ porque de nada vale , se há uma criança na rua .
Todo o tóxico do meu país entra pelo meu nariz /lavo carros, limpo sapatos, cheiro cola e também uso crack/ roubo carteiras, mas sou gente fina, sou um sorriso sem dentes/ chuva sem teto, unha com terra, sou o que sobrou da guerra/ um estômago vazio, um golpe no joelho que se cura com o frio/ o melhor guia turístico da redondeza/por três moedas te guio pela capital/ não preciso de visto para voar pelos arredores/ porque brinco com aviões de papel, / arroz com pedra, frango com vinho, e o que me falta eu imagino/ não deve andar o mundo com amor descalço/ acenar com um jornal com uma carta na mão/ subindo nos trens, substituindo o riso/ batendo- nos peito com um lado cansado/ não deve andar a vida recém- nascida, a preço/ a infância arriscada por uma extrema ganância/ porque, então as mãos são fardos inúteis/ e o coração, apenas uma pobre palavra / quando cai a noite, durmo acordado com um olho fechado e o outro aberto/ porque senão os tigres me mandam um balaço/ minha vida é como um circo, mas sem palhaço/ vou caminhando pelas ruas fazendo malabares com cinco laranjas/ pedindo moedas a todos numa bicicleta com uma só roda/ sou oxigênio para este continente/ sou o que o presidente descuidou/ não se assuste se tenho mau hálito/ se me vês sem camisa com as tetas ao vento/ sou um elemento a mais na paisagem/ os resíduos da rua sem camuflagem/ como alguma coisa que existe, mas de mentira/ algo sem vida, mas que respira/ pobres são aqueles que esqueceram de que há/ crianças na rua/ que há milhões de crianças vivem na rua/ e muitas crianças que crescem nas ruas/ eu os vejo apertando seu pequeno coração/ mirando - nos a todos com uma fábula nos olhos/ um relâmpago truncado cruza seus olhos/ porque ninguém protege a vida que cresce/ e o amor faz- se perdido, como uma criança solta na rua " .
Traducao livre da canção " Hay un niño en la calle " .
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