sexta-feira, 14 de outubro de 2022

 Chico e os Ciganos , nos Anos 60

Despertou - se o garoto Chico , no breu da noite, e ficou colado ao postigo, saboreando o tilintar compassado do trote de cavalos, chapinhando o chão em busca do Campo do América, junto ao leito do Riacho Pajeú , em Fortaleza. Barracos de lona saltaram do chão como num passe de mágica. Uma sanfona chorou enquanto reinou a escuridão da noite , uma plangente melodia , nem de longe parecida com nosso forró pé de serra.
Uma gente bizarra, colorida e festeira tomou conta do sonolento bairro da Aldeota, em Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, naquele ano de 1960. Era uma leva de ciganos , vindo, sei lá , dos confins do mundo , nômades , com ouro escorrendo pelo corpo , com cartomantes , quiromantes , e cabras da peste que não levam desaforo pra casa.
O adolescente curioso , Chico , dispôs- se a jogar sua diminuta mesada , destinada a compra da Revista Rin - Tin - Tin , na fogueira , na prática da quiromancia , ali posta à sua disposição. Como numa lâmpada de Aladim , alumiou - se de súbito, a mimosa figura de uma cigana , de cabelos negros , olhos pecadores , com lábios cheios e , exageradamente rubros.
Ao lado dela , vigilante e severo , um homem mal encarado, bolindo no leito das unhas com um punhal longo e brilhante .
O jovem Chico , ofertou a mão, o mais firme que conseguiu para uma bela quiromante .
" - Filho , vejo um vermelho de sangue e fogo no seu futuro brilhante , e você como um garboso soldado do fogo, ou um médico. Prevejo você ateando fogo em muito coração feminino, por esse mundo afora ."
Chegando em casa , num êxtase, ardendo em febre interna , Chico detona o petardo para sua mãe sobre seu futuro imaginado , queimando corações.
Não deu tempo nem de terminar o panfletário discurso, e o moleque desapareceu debaixo de uma peia de cinturão para acordar do destrambelhado sonho vermelho. Dois dias depois , quando o tropel de cavalos partiu numa madrugada fria , com destino desconhecido , avistava - se o jovem bombeiro Chico , montando um ginete , e na garupa , grudada no seu cangote , uma bela princesinha morena , um verdadeiro colibri, um arco - íris de desejo que gorgeia cantigas flamenco de amor e paz . O sonho durou pouco.
O doidinho Chico , no dia seguinte retorna para Fortaleza , com farol baixo , para o seu cantinho, na rua Rodrigues Junior, junto à sua família.
" Eu vou partir, pra cidade garantida , proibida / arranjar meio de vida, Margarida / pra você gostar de mim/ essas feridas da vida Margarida / essas feridas da vida , amarga vida / pra voce gostar de mim/ veja você, arco - íris já mudou de cor / e uma rosa nunca mais desabrochou/ e eu não quero ver você/ com esse gosto de sabão na boca/ veja meu bem, gasolina vai subir de preço/ e eu não quero nunca mais seu endereço/ ou é o começo do fim... ou é o fim/ essas feridas da vida Margarida/ essas feridas da vida , amarga vida/ pra você gostar de mim " .
Música " Margarida " , da autoria de Vital Farias .
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Martinho Rodrigues, Josias Cavalcante e outras 59 pessoas
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